Barco à deriva
Moro deixa cair a máscara e fica com ladrão das rachadinhas
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emNa eleição da baixaria e da pirataria em busca do eleitor, tudo pode acontecer, inclusive e provavelmente nada além do que está traçado. Apesar do estardalhaço, da romaria e da violência explícita da campanha de um dos dois candidatos, o roteiro do primeiro turno não deve ser modificado. Mesmo desacreditadas pelo entorno do principal inquilino do Palácio do Planalto, as pesquisas mostram que boa parte do eleitorado nacional se bandeou definitivamente para o outro lado. E, ao que parece, não volta nem que o pastor e os obreiros obriguem. Os números dessa segunda-feira (54% contra 46% dos votos válidos) são incontestáveis. Tudo indica que esse é o script desejado pela maioria dos 156 milhões de votantes brasileiros.
A menos que ocorra um cataclisma, os dados de 2 de outubro preconizam 57 milhões garantidos para o candidato que aposta na democracia, 6 milhões a mais do que o que flerta dia e noite com a tirania. É assim que a banda tem tocado. São dois candidatos antagônicos até na anatomia. Enquanto um prega o conservadorismo exagerado e que ele mesmo não professa, o outro é favorável ao liberalismo. O que ocupa o cargo quer mais um mandato para fazer o que prometeu e ainda não conseguiu: acabar com o Brasil. O que pensa em voltar imagina um terceiro tempo para recuperar a autoestima do povo, a imagem do país e a sua própria, arranhada até a alma por conta de episódios até hoje esclarecidos pela metade. Como sabiamente afirmam os amigos João e Calixto, doutores da experiência, Jair Messias resolveu adotar um discurso de candura, mas de bonzinho ele não tem sequer a máscara.
Mascarado ou com a cara de mau que o consagrou, fará de tudo para mostrar a seus seguidores que a pele de cordeiro foi usada exclusivamente para enganar os bestas. Em resumo, governará para uma meia dúzia e o restante que se exploda. Mestre das coisas da vida, Calixto e João vão além e asseguram que a escolha por Luiz Inácio não é ideológica, mas necessária. Segundo eles, após anos tentando explicar o inexplicável, Lula terá obrigação de fazer o melhor governo que o Brasil já teve. Ele (Lula) não tem mais tempo para errar. Portanto, não há hipótese de tergiversar. É calça de veludo ou o fiofó de fora. Simples assim. O posicionamento de ambos é o perfil mais cristalino do eleitor brasileiro de hoje. É nessa lista que me incluo. Já deixei bem clara minha posição em narrativas anteriores. Numa situação normal, não escolheria Lula nem Bolsonaro.
Como vivemos um período de anormalidades e de futuro imprevisível, não sou, mas estou Luiz Inácio até debaixo d’água. A mentira está custando muito caro ao povo e ao país. Por isso, precisamos encontrar um novo “herói” e dar a ele a chance de renovar o verniz da credibilidade. É bom esclarecer que o adjetivo herói só é cabível caso Lula vença a disputa do dia 30 deste mês. Só alguém com capa de bom navegador poderá remendar os buracos deixados à mostra pelo presidente da pátria e da família. A nação é um barco com enormes rombos no casco e à deriva. Imaginem o tamanho do naufrágio se tivermos mais quatro anos de vendaval, negacionismo, homofobia, racismo e preconceitos maldosos e perversos contra pobres e nordestinos. Será o fim do mundo? Certamente não, mas do Brasil não tenham dúvidas. Quem acreditará em nós? Quem dará crédito a nossos homens públicos, especialmente juízes? Quem ainda terá vontade de investir em um povo que não aceita seu próprio povo?
Sem exagero e com margem de erro de zero para baixo ou para cima, estaremos entregues às baratas de esgoto caso o resultado do segundo turno seja diferente do primeiro. A maior prova de antecipação desse tenebroso cenário vem das entranhas do governo que diariamente mostra que a mentira e a hipocrisia continuarão sendo a tônica do mandatário. Responsável direto pelo sangramento e “expulsão” de Sérgio Moro do Ministério da Justiça, Bolsonaro convidou o antigo colaborador e desafeto para fazer parte da claque bolsonarista durante o debate do último domingo (16), na TV Bandeirantes. E Moro aceitou, foi usado e se deixou usar. Orientou o eterno e “querido” chefe – o mesmo a quem um dia chamou de “ladrão da rachadinha” – contra o homem cuja prisão, até prova em contrário, lhe rendeu a boquinha na Esplanada dos Ministérios.
Defenestrado do Planalto como víbora peçonhenta, o ex-juiz federal se prestou a um papel que beira o ridículo. Não passou de vaquinha de presépio de um presidente que só não o chamou de bonito. Pelo menos o gesto de Moro, senador eleito pelo Paraná, serviu para eu riscar seu nome de minha exclusiva lista de homens sérios e acima de qualquer suspeita. Gilmar Mendes tinha razão quando disse que “o legado de Bolsonaro foi devolver Moro ao nada”. Como mortal sem vitaliciedade ou foro privilegiado, me limito a afirmar que o Senado Federal já teve senadores muito mais capacitados. Assim como são as pessoas são as criaturas e serão os futuros senadores.