Tudo começou com a quarentena: o isolamento forçado colocou à prova todos os aspectos do morar e o mobiliário não ficou de fora. De uma hora para outra, um único ambiente passou a atender a mais de uma função, ao mesmo tempo em que outros, como o hall de entrada, ganharam importância. Melhor adaptados aos tempos pós-pandemia, novos móveis já despontam no horizonte: mais leves, fáceis de transportar e de limpar. Por ora, no entanto, flexibilidade virou palavra de ordem.
“Diria que nunca antes estivemos tão cara a cara com nossos móveis. Hoje sabemos o que esperar e, principalmente, o que não esperar, deles”, considera a arquiteta e diretora criativa da Artefacto, Patricia Anastassiadis. Segundo ela, por conta da redução do tamanho dos imóveis, a capacidade de agregar funções a uma única peça já era um valor perseguido pela marca há alguns anos, mas que agora promete ganhar espaço ainda maior nas novas coleções.
“Não me refiro apenas a uma mesa lateral que também possa vir a ser usada como banco, mas a peças que, sob todos os aspectos, do estético ao ergonômico, possam servir a mais de uma função. Como no clássico caso da mesa que, de repente, tem de se transformar em bancada de trabalho”, explica a arquiteta, que no ano passado colocou em linha um móvel do tipo, capaz de se integrar a diversos ambientes e já equipada com tomada USB.
Foi o caso da estilista Debora Alencar, que, como muitos, teve de adaptar o espaço de sua casa para atender aos novos tempos. “Moro em um estúdio de pouco mais de 30 metros quadrados. Trabalho em casa desde o início da pandemia, mas não disponho de um ambiente, e nem de espaço, para montar um home office. Coloquei a mesa de jantar na varanda e fiz dela meu local de trabalho durante o dia. Agora, a cadeira, tive mesmo de comprar”, conta.
Segundo Patricia, à medida em que a casa deixa de ser utilizada apenas como dormitório para passar a funcionar também como posto de trabalho, academia e até restaurante, ser flexível é quase uma condição que se coloca para qualquer móvel.
Para o designer Fernando Jaeger, que há 27 anos projeta, produz e comercializa suas criações, as pessoas passaram a olhar com mais atenção para suas casas. “Elas estão se preocupando em renovar coisas que queriam trocar há tempos e agora resolveram colocar a mão na massa. Mas, de uma maneira geral, não sentimos ainda a necessidade de mudar o design de nossas peças”, afirma.
“O que percebemos é que as pessoas estão interessadas em desfrutar ao máximo as horas passadas em casa. Seja por meio de uma cadeira mais adequada para o trabalho em home office, ou mesmo de uma poltrona mais confortável para os momentos de leitura”, observa o designer, que, em razão da alta procura, pretende ampliar sua linha de móveis e objetos voltados para os dois segmentos.
“Notamos que houve um considerável aumento na demanda por mobiliário para escritórios. O que antes era só um cantinho, agora ganhou relevância na casa e, por isso, além de novas cadeiras, estamos estudando formas de possibilitar que algumas peças, já existentes em nossa linha tenham mais opções.”
Um assento, uma sapateira, um descanso para o seu gato. Assim é o banco Mecano, criado pelo estúdio Menaa para servir a objetivos ainda mais amplos do que facilitar o tira e põe de sapatos, no hoje concorrido espaço do hall de entrada.
Tendo como matéria-prima um elemento pouco afeito ao universo doméstico, as eletrocalhas, antigamente produzidas para finalidades industriais, o Mecano surpreende por sua simplicidade, em contraponto a suas múltiplas possibilidades de utilização.
“Acredito que a função do designer hoje não é apenas criar móveis que atendam a diversas finalidades. Para mim, a versatilidade responde a um propósito universal. No caso, acumular funções para diminuir ao máximo o impacto ambiental”, declara o arquiteto e designer Carlos Mena, autor do projeto.