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‘Mulher que produz não deve nada a ninguém’

De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), existem atualmente 9,3 milhões de mulheres à frente de uma empresa no Brasil, o que representa 34% de todos os donos e donas de negócios do país. Essas mulheres empreendem com o objetivo de ter uma outra fonte de renda ou para garantir sua independência financeira, e é com essa perspectiva que a Secretaria da Mulher desenvolve e promove políticas públicas visando ao empreendimento feminino.

Nesta entrevista a titular da pasta, Ericka Filippelli, enfatiza a importância que a atividade empreendedora e a autonomia econômica têm para a sociedade feminina, destacando programas como Oportunidade Mulher, Empreende Mais Mulher e Mulheres Hipercriativas, que planeja capacitar 4 mil mulheres por meio de 40 professoras-facilitadoras.

Confira abaixo a conversa com a secretária, que também abordou o Observatório da Mulher, a luta por igualdade e as eleições para o Conselho dos Direitos da Mulher.

Como a senhora avalia a participação feminina na liderança de negócios e na atividade empreendedora no DF atualmente?

Uma das pautas dentro das políticas para as mulheres é a questão da autonomia econômica, não só na importância da inserção das mulheres no mercado formal de trabalho, como também na atividade de empreendedorismo e na ascensão de suas carreiras. Isso tem sido um foco das nossas atuações e do nosso trabalho na Secretaria da Mulher. Hoje nós temos um grande desafio, que é permitir que elas sejam autônomas. A participação feminina no mercado de trabalho, assim como a ascensão das mulheres a cargos de liderança e chefia, é prioridade para nós. Tanto que temos uma área, chamada Subsecretaria de Promoção de Políticas para Mulheres, voltada para essas ações. A gente tem trabalhado intensamente nessas frentes. O mais importante a avaliar hoje é a própria característica do DF: temos um setor de serviços muito forte, há uma participação efetiva das mulheres nos cargos públicos, mas a gente ainda precisa incentivar a inserção dessas mulheres no empreendedorismo, compreendendo que a autonomia econômica é fundamental para a mulher.

Qual é a importância de estimular a autonomia econômica para a sociedade feminina?

Uma mulher que se sustenta tem capacidade de escolha. A gente fala muito dessa questão do enfrentamento à violência contra a mulher, mas a gente tem que olhar o que está por trás muitas vezes; e, como podemos fazer para quebrar esse ciclo de violência, a autonomia econômica é uma estratégia. Temos pesquisas, como da Secretaria de Segurança Pública [SSP], que estuda todos os casos de feminicídio, identificando que a grande maioria das vítimas – e também identificamos isso nos nossos números – está desempregada, ou são estudantes, ou são do lar. Então a gente precisa incentivar essa atividade econômica, que a mulher possa empreender e conquistar sua autonomia econômica, porque com certeza isso vai assegurar a possibilidade de ela escolher qual o futuro dela, e não ser refém de uma situação.

Como a Secretaria da Mulher tem trabalhado para prover capacitação e empreendedorismo para as mulheres?

Desde o começo do governo, essa é a nossa prioridade aqui dentro da secretaria. Tanto é que, em julho do ano passado, nós criamos um espaço voltado para o empreendedorismo e para o acolhimento das mulheres em situação de violência. Temos dados dessa câmara técnica de monitoramento de feminicídios que mostram que a grande maioria das mulheres não buscou as delegacias e os equipamentos de atendimento; então, tivemos que criar alguma estratégia. Também há essa carência com a inserção no mercado de trabalho e o incentivo ao empreendedorismo; então, surgiu essa necessidade de criar um espaço voltado para isso. Nas agências do Trabalhador, inauguramos o Empreende Mais Mulher, onde, além de ter o espaço para o incentivo ao empreendedorismo e a capacitação, também temos atendimento psicossocial para mulheres em situação de violência. Durante a pandemia, tivemos que encerrá-lo temporariamente para não causar aglomerações, mas agora já reabrimos os espaços. E temos agora um programa novo, lançado em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos, que é o Mulheres Hipercriativas. Vai ser a possibilidade que a gente vai ter de remunerar 40 professoras-facilitadoras para chegarmos a quatro mil capacitações.

E sobre o Oportunidade Mulher? Como é o projeto e como a Secretaria avalia o feedback que está recebendo sobre ele?

Também no contexto de pandemia, tivemos uma reunião com o governador Ibaneis Rocha e os secretários, e ele entregou à gente uma missão: ele estava muito preocupado com a questão da autonomia econômica das mulheres e da proteção delas. Pensando nisso, a gente criou um programa chamado Oportunidade Mulher: por que não ela aprender, empreender e se capacitar em tempos de crise? Esse é o objetivo desse programa, que as mulheres em casa possam ter acesso a conteúdos programáticos voltados para a capacitação. Buscamos parcerias com a Rede Mulher Empreendedora, Senac, Senai, Fecomércio, BRB, e temos oferecido cursos on-line e gratuitos – já foram mais de 80. Tem sido um processo muito bonito, mulheres contando seus casos, aprendendo, empreendendo, repensando seus negócios, abrindo novas possibilidades. Estamos recebendo feedbacks muito positivos e gratificantes, mas ainda temos um desafio: nós abrimos essa possibilidade porque era o que nós tínhamos no momento, os cursos on-line e a distância, mas sabemos que existe uma lacuna, que é a situação de mulheres que não têm acesso à internet ou à tecnologia. Por isso estamos reabrindo o espaço Empreende Mais Mulher, e a ideia é que gente busque outros polos nas regiões administrativas, para poder suprir essa carência.

Muitos dos projetos desenvolvidos para estimular a autonomia econômica feminina têm o apoio de outras secretarias. Como tem sido o diálogo com as outras pastas, e qual a importância de realizar políticas públicas com parcerias?

Essa é uma característica do governador Ibaneis Rocha. Ele tem uma liderança e condução do governo sempre voltada para a integração das pastas. A Secretaria da Mulher trata de uma pauta transversal, então a gente tem ampla articulação com todas as demais secretarias. É claro que, quando a gente fala de autonomia econômica, estamos falando da Secretaria de Trabalho, de empreendedorismo, de desenvolvimento econômico – são pastas muito importantes para nós. Além do BRB, que também é nosso parceiro e criou um cartão, chamado Sou Mais Mulher, que reserva um percentual para ser reinvestido em políticas para mulheres em situação de violência. Essa é a nossa forma de atuar, e tem sido bem exitoso e importante.

O GDF lançou recentemente o Observatório da Mulher. Qual a avaliação que a senhora faz do projeto até o momento, e quais os próximos passos para melhoria e desenvolvimento da ferramenta?

O Observatório da Mulher tem sido buscado por vários estados e é referência nacional. Não existe nenhuma ferramenta no Brasil que reúna, num só portal, dados da mulher, não só voltados para o enfrentamento da violência, mas também para assistência social, trabalho, educação, saúde, além dos próprios dados da Secretaria da Mulher. Ele mostra a visão do GDF de integração e também a visibilidade que a gente precisa dar aos dados voltados para a maior parte da população, que são as mulheres. Foi criado um comitê gestor, e a partir de agora vamos dar um passo além: fazer a análise dos dados e oferecer, para a população, não só os indicadores, mas também a avaliação e, com isso, os encaminhamentos para a criação de políticas públicas voltadas para a mulher. Além disso, queremos chamar também as organizações da sociedade civil [OSCs] e a área acadêmica.

O mês de agosto marcou a campanha Agosto Lilás, de conscientização e prevenção à violência contra a mulher. Qual é o maior desafio na busca pela igualdade de direitos para as mulheres?

Acho que o maior desafio que temos hoje ainda é a falta de oportunidade. Precisamos garantir, e é por isso que o foco tem que ser a inserção das mulheres no mercado de trabalho, porque quando você fala na promoção e nesse movimento, você está dando a elas uma possibilidade imensa de serem autônomas economicamente e de promoverem o desenvolvimento. A mulher tem uma outra forma de atuar, que é promovendo a família, os filhos. E, quando você promove a inserção dessas mulheres na economia, você vai ter um ganho com isso. Existem pesquisas internacionais que comprovam esse argumento. Mas, para a gente falar sobre essa política, a gente precisa também falar sobre outras questões, e é aí que mora o desafio: garantir uma queda no índice de gravidez na adolescência, investir na qualificação, capacitação e oportunidade no mercado de trabalho para as mulheres, investir também na inserção das mulheres nas ciências exatas e tecnologia, que são altamente promissoras. São todas essas pautas que a gente trabalha aqui na Secretaria da Mulher, juntamente com a questão da autonomia econômica.

Este ano, as eleições para o Conselho dos Direitos da Mulher vão receber, pela primeira vez, candidaturas de representantes da sociedade civil para integrá-lo. Qual a importância deste movimento feito pelo GDF?

Isso é dar legitimidade a esse momento e poder abrir espaço para a participação da sociedade civil. A gente vive, além da pandemia do novo coronavírus, também uma outra, que é a questão da violência contra a mulher. A partir do momento em que você abre a possibilidade para que não só o governo sozinho esteja à frente de políticas para mulheres, mas também as organizações da sociedade civil participarem – porque muitas vezes são elas que estão lá na ponta, vivendo essa experiência, atendendo e acolhendo mulheres em situação de violência –, com certeza se dá mais visibilidade para a pauta, trazendo, com isso, mais contribuições, fortalecendo essa política e um conceito, no qual o governador Ibaneis Rocha tem insistido: a violência da mulher não é só uma questão feminina, mas da sociedade como um todo. Quando o governo traz para si essa responsabilidade e traz as organizações da sociedade civil para perto, estamos dizendo o quê? Que estamos também trabalhando no engajamento da sociedade, para melhorar nossos equipamentos, nossos serviços e, mais do que isso, ouvir as demandas e poder atendê-las.

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