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Sucumbindo

Nenhum país sobrevive em meio ao descrédito geral

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Ronaldo Caiado

As múltiplas facetas da crise brasileira –política, econômica, social, gerencial– convergem e se unificam em torno de um único ente: o Estado. A crise é dele e decorre, sobretudo, do deficit moral que ostenta. Não é condição recente, mas, sem dúvida, agravou-se enormemente no período em que teve o PT a conduzi-lo.

A hipertrofia agravou a ineficácia e o custo, favorecendo, por tabela, a corrupção. O que era latente tornou-se patente. As instituições estão, como nunca antes, desacreditadas perante a população. Os fatos recentes levaram esse quadro de deterioração ao paroxismo. Assistimos em 2016 ao impeachment da presidente da República e ao afastamento e à prisão do presidente da Câmara dos Deputados, ambos acusados de delinquir no exercício do cargo.

Não bastasse, diversos outros agentes públicos (PT em maioria) e empresários ou estão presos ou são réus ou estão denunciados. Ou as três coisas juntas.

No Judiciário, não são poucas as denúncias de venda de sentenças, com punição desproporcional à gravidade do delito (aposentadoria com preservação dos proventos), e salários que ultrapassam muitas vezes o teto constitucional.

Nenhum dos poderes escapa ao striptease moral em curso. O resultado é a crise institucional que presenciamos, sem precedentes.

O ano começou com duas crises agudas na área da segurança: uma, dentro dos presídios –em Manaus, Boa Vista, Natal–, e outra fora, nas ruas, no Espírito Santo. O saldo de mortes, na soma dos dois casos, ultrapassa duas centenas de pessoas.

Índice de guerra civil. Em ambos os casos, ressaltam a impotência e a omissão das forças repressivas, o braço armado do Estado. A polícia não agiu nos presídios, optando por assistir à matança entre os presos. E, no Espírito Santo, a PM ausentou-se das ruas.

Em três dias, 113 mortos. Somente no quarto dia, as forças federais se apresentaram, quando os danos já eram colossais.

Para que se tenha uma ideia da magnitude dessa tragédia, basta lembrar que, segundo números da Comissão da Verdade, morreram, ao longo dos 21 anos do regime militar –e na grande maioria dos casos em enfrentamento armado–, 434 pessoas, à média de 21 pessoas por ano. A crise capixaba matou mais de 30 por dia.

Segundo o Mapa da Violência, levantamento sistemático do número de vítimas da criminalidade no Brasil, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), a média anual, de uma década para cá, é de 60 mil mortos por ano, contabilizados apenas os que morrem no local do crime.

Só para efeito de comparação, os mortos civis na guerra da Síria, de 2008 até 2015, segundo levantamento do Observatório Sírio para Direitos Humanos, somam 71.781 civis.

É óbvio que é preciso mudar praticamente tudo em matéria de segurança pública. Mas é também óbvio que não se fará isso -não na plenitude necessária- dissociado de uma reforma em profundidade do Estado. Reforma moral e estrutural.

O gigantismo estatal gerou um monstro, que hoje tiraniza a sociedade; em vez de servi-la, serve-se dela, impondo-lhe uma das mais altas cargas tributárias do planeta. A corrupção é um subproduto, que se soma à monumental ineficácia dos serviços e condena as instituições ao mais profundo desprezo por parte da sociedade. Não há democracia que resista a isso por muito tempo.

A insurreição policial capixaba e os crimes da Lava Jato resumem, mas não esgotam, o quadro terminal da tragédia cívica brasileira. Nenhuma economia, ainda que conduzida com eficiência técnica, se sustenta em um ambiente de descrédito institucional.

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