Notibras

Ninguém esquece do Mogli, e bate uma saudade…

A revista do Mogli, o Menino Lobo
Eduardo Martínez

Sou idosa e não gosto muito de ler em celulares, computadores ou kindle, apesar de imaginar que, talvez, este último seja interessante. É que percebo nos olhos da minha neta um fascínio por esse tipo de aparelho, que parece querer se equiparar à antiga biblioteca que fez parte da minha infância.

Bons tempos, eu posso afirmar, quando era possível tatear e passar as páginas de um livro, alguma revista ou o jornal que papai me pedia para comprar todos os dias na banca do Vicente, que ficava logo ali na esquina. Não que hoje ainda não possamos sentir o inebriante cheiro do papel, mas creio que, talvez em alguma geração não muito distante, isso será apenas peça de museu.

Saudosismo que aflora, quero contar algo que me aconteceu nos meus então oito ou nove anos. Era domingo, pois a garotada estava toda reunida na rua. Papai, como de costume, me deu dinheiro para comprar o jornal. E lá fui eu quase correndo, pois queria ir logo brincar com meus amigos.

O Vicente, mal me olhou, pegou o jornal do meu pai e me entregou. No entanto, percebi algo que me encantou. Era uma revista do tamanho de revista de adulto, bem maior do que os gibis. Meus olhos devem ter brilhado, pois o dono da banca apontou para um exemplar.

— Joaquina, chegou a revista em quadrinhos do Mogli, o Menino Lobo.

Nem lembro se falei alguma coisa, saí correndo para casa, onde encontrei papai sentado na poltrona da sala. Ele me perguntou se eu havia me deparado com o Bicho-Papão. Só sei que, esbaforida, me postei diante do meu pai.

— Mogli.

— Quem?

— Mogli, o Menino Lobo!

Contei sobre a tal revista, e meu pai me pegou no colo e me deu um beijo na bochecha.

— Vamos lá no Vicente, que também quero ler essa revista desse guri que vive com os lobos.

Daquele dia até completar uns 12 anos, viajei muito pelas páginas maravilhosamente desenhadas. Cada detalhe me encantava e, não raro, percebia algo que havia passado em branco. De tão manuseada, as folhas foram ficando mais finas, um rasgo aqui, outro ali, mas nada que uma boa fita durex não resolvesse. Isso até que a guardei no fundo do armário e nunca mais a folheei.

Pouco tempo depois de terminar a faculdade, procurei minha tão amada revista. Não sei se aconteceu em uma das mudanças ou se foi por conta de alguma faxina. Ela sumiu. Nunca mais a encontrei.

O tempo, desde então, parece ter voado. Comecei a trabalhar, conheci meu futuro marido, com quem me casei alguns anos após. Vieram os filhos e, há alguns anos, nasceu a Evelina, minha neta. Não sei o que me deu hoje, mas bateu uma saudade tão grande da minha revista do Mogli.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

Compre aqui 

http://www.joanineditora.com.br/57-contos-e-cronicas-por-um-autor-muito-velho

Sair da versão mobile