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Casamento imposto

Nome de santa, Aparecida teve de obedecer ao deus pai

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

O ano, não sei ao certo, mas foi pelos idos de 1952, 1953. Talvez pouco antes ou tanto adiante, mas nada que atrapalhe a história, mesmo porque, naquela época, tudo me parece meio embaralhado. Meus netos dizem que é por conta da memória falha própria da idade. Tenho cá minhas dúvidas ou, então, sofro do mal que acomete boa parte das pessoas, que é esquecer o passado para repeti-lo como se fosse algo inédito.

Dona Albertina e seu Francisco, na casa dos 50 anos, possuíam onze filhos, sendo apenas a caçula menina, Maria Aparecida. Ela recebera o nome como pagamento de promessa à santa favorita da família, que há muito desejava uma garotinha. Não que os outros filhos também não tivessem nomes de santos: Onofre, João, Nicolau, Antônio, José, Sebastião, Pedro, André, Érico e Jorge.

Maria Aparecida era venerada por todos, que chamavam a miúda de Cidinha. Apesar dos mimos, ela não parecia mimada, mas gentil e amigável com todos. Além do mais, ajudava a mãe nas tarefas do lar, enquanto os irmãos, todos em idade para trabalhar, ajudavam o pai na padaria. Enquanto alguns faziam pão, bolos e salgados, outros atendiam no balcão.

Certa feita, mudou-se para a casa ao lado uma família quase tão grande como a da Cidinha. Entretanto, era uma casa repleta de filhas e apenas um varão, justamente o mais velho, que raramente dava as caras, pois estudava na capital. As idades dos herdeiros das duas famílias se regulavam, inclusive das duas mais novas. Helena, justamente a mais bonita, contava lá seus 16 anos, a mesma idade da Cidinha e, naturalmente, fizeram amizade.

Érico e Jorge se encantaram pela linda garota e tentaram de tudo para chamar a sua atenção. Todavia, Helena não parecia atraída pelos rapazes. Comentava-se até que a donzela estivesse de namorico com outro, pois, não raro, o carteiro entregava correspondência para a dita cuja.

Os enamorados, não se sabe se movidos por bom propósito ou por puro despeito, foram ter uma conversa com o pai. Eles disseram que não era de bom alvitre Cidinha ficar de conversa com Helena, pois esta não parecia ser de confiança. Preocupado, seu Francisco chamou a filha para uma conversa.

— Cidinha, todos nós não estamos gostando da sua amizade com essa tal Helena. Os comentários sobre ela não são dos melhores. Como nós não a conhecemos, é melhor você parar com essa amizade.

A garota, apesar de confusa, não quis contrariar o pai. Nos dias seguintes, ela evitou a amiga, até que a própria Helena deve ter percebido o que teria acontecido. Tanto é que nunca mais procurou pela filha da dona Albertina e do seu Francisco.

Quando chegou a idade de casar, Cidinha foi desposada por um homem escolhido pelo pai. Viveu uma vida quase idêntica à de sua mãe, apesar da prole um pouco menor: oito filhos, todos com nomes de santos. Quanto à Helena, não se sabe ao certo qual foi o seu destino, pois seu nome foi deixado de lado até que caiu por completo no esquecimento.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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