Nova lei confunde tudo e manifestação pública pode ser vista como um ato terrorista
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emAprovado na última quinta-feira (13) pela Câmara dos Deputados, o projeto de Lei 2016/15, de combate ao terrorismo, foi criticado pelo vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sergio Lima. Para o especialista, a proposta restringe direitos e pode enquadrar manifestantes e movimentos sociais como terroristas.
“É claro que depredações precisam ser punidas como crime, mas isto é terrorismo? Quando a gente fala de terrorismo, o Estado está autorizado a suspender direitos da população. A gente quer resolver o problema suspendendo direitos ou garantir que os direitos sejam exercidos em sua plenitude?”, questionou o sociólogo.
O projeto classifica os crimes motivados por “xenofobia, religião, discriminação ou preconceito de raça, cor ou etnia” e praticados com o objetivo de intimidar o Estado, organização internacional, pessoa jurídica, contra a vida e integridade física e provocar terror generalizado na ordem social, punindo com penas que vão de 12 a 30 anos, em regime fechado.
O texto aprovado tipifica como crimes de terrorismo usar, ameaçar, transportar e guardar explosivos e gases tóxicos, conteúdos químicos e nucleares praticados com o intuito de intimidar o Estado, organização internacional, pessoa jurídica e provocar terror generalizado na ordem social.
Incendiar, depredar meios de transporte públicos ou privados ou qualquer bem público, bem como sabotar sistemas de informática, o funcionamento de meios de comunicação ou de transporte, portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais e locais onde funcionam serviços públicos também entram na tipificação do crime.
O especialista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública explica que a tipificação não é o maior problema. Para ele, a questão está no poder dado ao Estado para considerar o que pode ser enquadrado como terrorismo.
“O problema é quando a gente autoriza o Estado a tomar decisão na ponta da linha, ou seja, vai ser o policial e o juiz que vai determinar”, diz Lima. “Na Copa do Mundo, por exemplo, todos queriam que este projeto fosse aprovado para garantir a segurança, porque todos achavam que seria um caos. E a gente teve o contrário. A segurança foi elogiada por todos”, completou.
O projeto, que foi encaminhado ao Senado, também é criticado pelo deputado Chico Alencar (Psol-RJ), que citou casos ocorridos durante as manifestações de 2013 para justificar as críticas. “Uma pessoa pobre no Rio de Janeiro foi presa e condenada porque carregava um Pinho Sol. Porque era pobre, foi preso e condenado e está até hoje preso”, disse Alencar no dia da votação.
Segundo ele, o projeto abre margem de interpretação subjetiva para tipificar o crime. “Há uma semana, o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra] ocupou o Ministério da Fazenda para conseguir uma audiência com o ministro e isso poderia ser encarado como terrorismo”, disse.
O deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que foi o relator do projeto na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, rebate as críticas argumentando que a proposta não fere direitos constitucionais. “Este projeto é, sobretudo, uma defesa dos direitos e das garantias, porque não ameaça nenhum deles, e também dos movimentos sociais, sejam eles quais forem, porque nenhuma legislação hoje no mundo excepcionaliza, como essa excepcionaliza, os movimentos e a eles dá garantias”, afirmou Jungmann antes de votar favoravelmente ao projeto.
O parlamentar disse que não encontrou, nas leis analisadas, uma que tivesse a preocupação de não criminalizar as manifestações de movimentos sociais, sindicais, religiosos ou de classe profissional cujos objetivos sejam a defesa de direitos, garantias e liberdades constitucionais.
“A tipificação do crime de terrorismo, porque ele fere bens que são múltiplos e amplos em qualquer lugar do mundo, não é uma coisa fácil de fazer. Mas nós, aqui, excepcionalizamos os movimentos sociais, tanto aqueles que estão ligados ao campo, como o MST, quanto aqueles que vão à rua contra o atual governo”, disse.
Luciano Nascimento, ABr