Assunto do momento em qualquer roda, inclusive nos quadrados dos quartéis das polícias militares, o golpe arquitetado por Jair Bolsonaro e seus talibãs precisa, antes de qualquer avaliação militar ou política, ser analisado por uma junta psiquiátrica. Quando se fala em rebelião, obviamente a intenção é golpear alguém ou alguma coisa. No caso em questão, a intenção golpista do presidente é contra quem? Ele é, ao mesmo tempo, o protagonista e o antagonista da ação? O motim dele é para atingi-lo? Sinceramente, não faz sentido. Pelo que se diz por aí, parece que a ideia antidemocrática é para conter o avanço comunista no Brasil. Que comunismo? Definitivamente, esse povo não sabe o que diz. Nem Lula ou Dilma, notórios representantes da esquerda, agiram como comunistas. Não temos essa cultura. Imbecilidade alguém imaginar que pensar no povo é sinônimo de comunismo ou socialismo.
Também ouvi dizer que Bolsonaro quer virar ditador para evitar a volta de Luiz Inácio e a consequente venezuelização do país. Mais um despautério do grupo bolsonarista, que, na onda do fanatismo ideológico, não percebe que é exatamente o contrário. A tomada de poder atingirá de morte a nação como um todo. Direita, esquerda e centro sofrerão consequências idênticas. Isolados econômica e politicamente desde o negacionismo da pandemia de covid, não teremos ajuda alguma de governos democratas, como é a maioria dos povos mais ricos. Comunista por devoção, a Rússia de Putin riria de nós caso buscássemos ajuda no Kremlin. Sobrariam a Argentina, a Colômbia, o Chile e o Uruguai. Democracias consolidadas, duvido que, inicialmente, esses países reconhecessem a ditadura brasileira. Depois, dificilmente poderiam nos socorrer, na medida em que faltam recursos para a subsistência dos próprios nativos.
Sem exportar ou importar nada, quebraríamos generalizadamente. Viveríamos literalmente de brisa. Nem o PIX conseguiria drenar as contas correntes dos evangélicos e milicianos golpistas. Sem apoio e ajuda financeira de grandes e médios, o califado nacional seria obrigado a buscar reconhecimento de bolivianos, equatorianos, afegãos, haitianos e até de venezuelanos. Aí sim, estaríamos entregues à própria sorte, como estão hoje os visionários fãs dos mitos Hugo Chávez e Nicolás Maduro, que, por nada, fecharam o Supremo e o Congresso de lá. É isso que querem os maluquetes que defendem o fechamento do Supremo Tribunal Federal e a prisão de seus integrantes? Como não sobrarão cargos, carros oficiais ou imóveis funcionais para atender à massa de fundamentalistas, terão o mesmo fim: a miséria. Infelizmente seremos todos jogados no mesmo barco das milícias fardadas e sem raciocínio lógico.
Se é só para fechar o STF, convém lembrar aos distintos golpistas que tal façanha não foi alcançada nem mesmo no período mais negro da ditadura militar iniciada em 1964, quando o comando ditatorial era de generais e o golpeado tinha nome, sobrenome e CIC, hoje CPF. E olha que pensaram nisso. Também tentaram derrubar e prender os ministros do STF. O máximo que conseguiram foi a aposentadoria compulsória de alguns, já que, contra a vontade da maioria dos brasileiros, os magistrados são diferenciados, inclusive do presidente da República. O cargo deles é vitalício, isto é, não se extingue. Quero dizer que afastados, aposentados, expulsos ou presos, permanecerão ministros. Quanto a Bolsonaro, se não for reeleito e se não tomar de assalto o Palácio do Planalto, será elevado à condição de ex-presidente e seus seguidores condenados aos ostracismo como ex-talibãs.
É claro que os ataques do presidente às instituições preocupam a todos, especialmente àqueles acostumados a viver em democracia, ou seja, em paz, seguindo as leis e aceitando que, nas disputas políticas, hajam vencidos e vencedores, que dela participem adversários e não inimigos. Tudo é possível e razoável para Jair Bolsonaro. Impossível é ele admitir que é um derrotado, um político fracassado. Por isso, faz do discurso da liberdade uma segura plataforma para futura impunidade. Confunde o voto impresso com um tanque de guerra contra a eleição presidencial. Em síntese, não quer a paz ou a democracia. Estamos à beira do caos, mas fecho com aqueles que não apostam em um embarque dos militares em uma nova empreitada de tomada e manutenção no poder por décadas.
Também é notório que os Estados Unidos tomariam posição muito diferente daquela adotada em 1964, quando o democrata Lyndon Johnson, mesmo desconhecendo nossa realidade, apoiou o fim da maior democracia da América Latina. Resta saber se os norte-americanos ainda têm tanto interesse em nós como tinham na época. De qualquer maneira, o mesmo EUA nos deu como exemplo o fim melancólico de um déspota. Donald Trump tentou de tudo para se manter presidente, inclusive incitando a invasão do Capitólio, o Congresso deles. Estarrecido, o mundo inteiro assistiu à barbárie e, dias depois, à consolidação da derrota de um magnata que se afundou em sua própria mediocridade. E vejam que estamos anos luz de distância da força e poder à disposição do mago das finanças yankes. O povo o preteriu.
Com nosso aprendiz de feiticeiro não será diferente. Não há nada mais vulgar do que confundir o desejar com o querer. Vontade é o desejo daquilo que não se tem, é ausência. Pior de tudo é quando o homem descobre que não tem mais em quem jogar a própria culpa. Então, ele diz: É a vontade de Deus. Entretanto, é bom lembrar que nem tudo que acontece é Sua vontade (de Deus), mas nada acontece sem Sua permissão. Por fim, vale reiterar que gente bem resolvida não inferniza a vida alheia. O 7 de Setembro deverá ser sangrento, talvez o início do fim do Brasil progressista. Quem sabe apareça um novo doidão fantasiado de petista com uma faca em punho. Está claro que o levante é apenas uma tentativa de evitar futuras prisões de golpistas. Ocorra o que ocorrer, tudo será debitado na conta do capitão. Antes de optar pelo golpe como solução para sua liberdade, o presidente bem que poderia trabalhar pelo povo brasileiro. Para isso ele foi eleito.