Ricardo Brandt
O comportamento amistoso do empresário Marcelo Odebrecht, mantido desde o início da negociação de delação premiada com a força-tarefa da Operação Lava Jato, mudou nas últimas duas semanas. Quem frequenta a carceragem da Polícia Federal em Curitiba diz ter encontrado o “Príncipe” – como o empreiteiro é conhecido pelos colegas de cárcere – colérico. A mudança de comportamento seria reflexo das dificuldades de seus advogados em fechar o acordo de delação nos moldes como o empresário planejou.
Três pontos travam o acerto para uma colaboração premiada com a Lava Jato. O primeiro é o tempo de prisão. Marcelo Odebrecht diz já ter permanecido tempo demais preso. Por isso, em troca do acordo, pediu para ficar dois anos e meio preso, descontado o um ano e quatro meses já cumprido. A proposta foi rejeitada pela força-tarefa da Lava Jato. Para eles, o empresário precisa ficar pelo menos mais dois anos e meio em regime fechado.
Primogênito de Emílio Odebrecht, que assumiu a condução das negociações da delação, o empreiteiro está detido, em Curitiba, desde 19 de junho de 2015. Acusado de ser um dos líderes do esquema de cartel e corrupção na Petrobrás, Marcelo Odebrecht vislumbrava que suas propostas fossem integralmente aceitas pela força-tarefa.
O empresário disse a terceiros, segundo apurou o Estado, que deixaria a mesa de negociações se a força-tarefa não aceitasse a redução do prazo de prisão em regime fechado e negasse uma saída temporária no Natal e no ano-novo.
Já condenado pelo juiz Sérgio Moro a 19 anos e quatro meses de prisão, Marcelo Odebrecht ainda é alvo de outras ações e pode ter pena imposta superior a 50 anos. A proposta que montou com o pai e advogados, nos últimos três meses, reduziria em 89% sua condenação inicial.
O segundo ponto diz respeito à responsabilidade do empreiteiro nos crimes praticados pelo Setor de Operações Estruturadas – chamado por investigadores de “departamento do propina” da empreiteira. Na mesa de negociação, a força-tarefa diz ter provas da participação direta de Marcelo Odebrecht na área, bem como de sua responsabilidade sobre pagamentos ilegais e de caixa 2 e pela lavagem de dinheiro. A defesa do empresário, no entanto, alega que o departamento funcionava sem a intervenção do então presidente do grupo.
Para os investigadores, Odebrecht tenta diminuir sua responsabilidade ao inflar o número de executivos dispostos a fazer delação e creditar a eles a decisão sobre ordens de pagamentos. O Estado apurou que a força-tarefa não aceita essa tese. “Sofisticaram tanto o esquema que acreditaram que seriam intocáveis, que a força-tarefa não conseguiria provar no mérito as acusações de crimes”, disse, em reservado, um dos investigadores envolvido na tratativa da delação.
O terceiro entrave trata das possíveis ações de “contrainteligência” adotadas pela empreiteira. A força-tarefa quer ouvir do empresário detalhes do que considera ações de obstrução às investigações e ofensivas extrajurídicas de ataques a investigadores, como a suposta compra de informações de conversas de delegados da Lava Jato em redes sociais e dossiês. O empreiteiro nega participação.