Quando está diante de um microfone ou de uma câmera de televisão, Jair Bolsonaro não desperdiça a oportunidade de atacar a criminalidade, exaltar policiais que matam no exercício da profissão e defender o armamento da população e a redução da maioridade penal. Não é entre o público preocupado com segurança, porém, que o discurso do candidato do PSL à Presidência tem feito mais sucesso.
Análise do Estadão Dados em 27 pesquisas recentes do Ibope, feitas em todos os Estados e no Distrito Federal, revela que Bolsonaro não tem taxas maiores de intenção de voto nos locais onde a preocupação com segurança é mais expressiva. Mas outra associação salta aos olhos: o desempenho do candidato melhora conforme aumenta a parcela do eleitorado que cita a questão da corrupção como prioridade.
Os dados indicam que o principal combustível do “bolsonarismo” não é o medo da violência, mas o moralismo – que, no atual contexto político, se confunde com o antipetismo. A leitura das 27 pesquisas revela que a percepção da corrupção como problema passa por um corte ideológico. Outros candidatos do espectro da centro-direita e que se apresentam como antagonistas do PT, como Geraldo Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos), também colhem mais apoio nos Estados onde os eleitores se mostram mais preocupados com a punição dos corruptos – mas em menor quantidade que Bolsonaro.
O fenômeno oposto se manifesta no eleitorado lulista: quanto menor a preocupação com corrupção, maiores as taxas de intenção de voto em Luiz Inácio Lula da Silva – preso e condenado na Lava Jato e que teve a candidatura à Presidência barrada pela Justiça Eleitoral anteontem.
Santa Catarina é um bom exemplo do descompasso entre a preocupação com a segurança e o voto em Bolsonaro. Lá, apenas 35% do eleitorado se declara preocupado com a segurança – a taxa mais baixa em todo o País, nesse quesito. Mas, entre os catarinenses, Bolsonaro ficou à frente na corrida eleitoral até no cenário em que Lula foi incluído na lista de candidatos apresentada aos entrevistados (26% a 20%).
Não é um caso isolado. Quando expostos em um mapa, os resultados das pesquisas Ibope nos Estados mostram uma distribuição não homogênea da preocupação com segurança, que é maior no Nordeste que no Sudeste. O oposto acontece com as taxas de apoio a Bolsonaro. Já o mapa da preocupação com a corrupção é bem mais parecido com o da intenção de voto no candidato do PSL.
O perfil dos eleitores de Bolsonaro – ele é o preferido nas camadas mais escolarizados e de renda mais elevada – e seu padrão de votação nos Estados indica que o capitão reformado é o principal “herdeiro” da onda antipetista e anticorrupção que abalou o cenário político do país nos últimos anos, e que tinha como discurso unificador o combate à corrupção.
Essa onda já foi mais forte. Atualmente, na média ponderada das 27 unidades da Federação, a corrupção é citada como uma das principais preocupações por praticamente metade do eleitorado (49%), em empate técnico com a educação (47%) e bem atrás da segurança pública (75%). Em dezembro do ano passado, a corrupção estava no primeiro lugar desse ranking, com 62%.
Há diferentes possíveis leituras para o fenômeno de Bolsonaro não ter melhor desempenho nos Estados que mais sofrem com a insegurança. Os eleitores podem estar recebendo o discurso do candidato com desconfiança. Mas também é possível que esse discurso ainda não tenha atingido o eleitorado mais afetado pelo problema – nesse caso, Bolsonaro teria espaço para crescer.
As pesquisas do Ibope feitas nos 26 Estados e no Distrito Federal abrangem, somadas, uma amostra de cerca de 25 mil eleitores. Para analisar os resultados, o Estadão Dados ponderou as pesquisas de acordo com o tamanho do eleitorado – assim, os dados de São Paulo tiveram peso 97 vezes maior que os de Roraima, por exemplo.
As pesquisas avaliaram a intenção de voto dos eleitores para presidente, governador e senador. O entrevistados também foram convidados a apontar as três áreas em que a população do Estado mais enfrenta problemas.
Ao comparar o desempenho dos presidenciáveis com as taxas de citações a cada problema, foi possível detectar a existência ou não de associação entre eles. Com exceção dos dados de Lula, os dos demais candidatos à Presidência foram avaliados no cenário sem a presença do ex-presidente. No caso de Alckmin, por exemplo, a análise indicou que seu desempenho piora à medida que cresce a preocupação com saúde e com a segurança pública.
Todas as pesquisas foram registradas na Justiça Eleitoral. Os dados relativos a São Paulo foram obtidos do levantamento contratado pelo Estado e pela TV Globo, no qual foram ouvidos 1.204 eleitores entre os dias 17 a 19 de agosto. A margem de erro foi de três pontos porcentuais, para mais ou para menos. O protocolo de registro no Tribunal Superior Eleitoral foi o BR-05723/2018.