País está sem governo, diz Marco Aurélio, ministro do Supremo, revelando o óbvio
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emO ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que existe hoje no cenário nacional uma crise política sem precedentes, calcada na ausência de entendimento entre os poderes Executivo e o Legislativo. Sem citar nominalmente os personagens centrais dessa queda de braço entre os dois poderes, a presidente Dilma Rousseff, chefe do Executivo nacional, e o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, o ministro do STF disse que a atual crise afeta diretamente a vida dos cidadãos e revela que hoje não há governo no País.
“Ocorre que ante essa crise política aprofunda-se uma crise que interfere na mesa do cidadão, que é a crise econômica e financeira. E surge o impasse a revelar que precisamos reconhecer que hoje não temos governo, hoje não se consegue governar este país continental, que é o Brasil”, disse o magistrado, em palestra no Insper, na capital paulista.
Na avaliação do ministro do STF, por conta deste impasse não se consegue tocar medidas econômicas e financeiras indispensáveis à superação da crise econômica, com desemprego crescente e inflação alta. “Precisamos deixar interesses políticos paroquiais em segundo plano”, defendeu, frisando que é preciso afastar também a corrupção, segundo ele algo que passou a integrar a nossa cultura. Para ilustrar sua crítica, disse que em suas vindas a São Paulo viu uma nova empresa surgir, que é ‘a empresa aluga-se e vende-se’ (pela grande quantidade de imóveis sendo alugados ou à venda), em razão da atual crise. Ele frisou que a paciência tem um limite, “que é o descontentamento social ”
Mensalão – O ministro disse que o simbolismo maior do julgamento do processo que ficou conhecido como mensalão (AP 470) foi revelar que a lei vale para todos. “Foi revelar que o processo não tem capa, o processo tem conteúdo e cabe ao Supremo tornar concreta, em termos de eficácia, a ordem jurídica brasileira. Vimos serem julgados e condenados o auxiliar direto do presidente da República e chefe da Casa Civil, o cidadão José Dirceu, deputados representantes do povo brasileiro, dirigentes do partido, presidentes, tesoureiro, empresários e banqueiros.”
Ao falar do mensalão, Marco Aurélio Mello disse que, quando tomou posse, em sua passagem na presidência do TSE, disse algo que na ocasião (2006) foi classificado como “ácido e cáustico”. Disse que o País estava vivendo o maior escândalo que se poderia imaginar. “Hoje dou a mão à palmatória ante o surgimento da Operação Lava Jato, a revelar não uma corrupção qualquer, mas uma corrupção no atacado. Basta que tenhamos presente que alguns dos envolvidos se dispuseram a devolver milhões de dólares”, afirmou.
Apesar da avaliação, o ministro disse que é preciso reconhecer que foi graças ao funcionamento das instituições, citando a Polícia Federal, o Ministério Público e a magistratura, e a liberdade e participação dos órgãos de imprensa, que esses escândalos vieram à tona. “As instituições despertaram para a busca de correção de rumos, graças a uma imprensa que é pilar da democracia, a uma imprensa livre, que não escamoteia as mazelas que ocorrem principalmente na administração pública. Já não se varre mais para debaixo do tapete, a imprensa levanta, revela dados, informando e as instituições atuam buscando elementos para definir as responsabilidades, por isso sou otimista e é justamente o fato de ser otimista que me faz permanecer no ofício de julgador.”
Na palestra que proferiu a uma plateia formada em sua maioria de estudantes do Insper, o ministro disse que a sociedade brasileira não pode mais viver aos solavancos e que o Brasil não precisa de novas leis. “Não precisamos mais de emendas constitucionais, o que precisamos é de homens públicos decentes, precisamos de um verdadeiro banho de ética.” Marco Aurélio criticou também os programas sociais do governo – como o Bolsa Família, que foi uma das principais bandeiras eleitorais do PT – dizendo que eles acabaram criando uma “casta de acomodados”. E que a correção de rumo do País não passa por esse sistema assistencialista.