Na semana em que o metro quadrado da mentira é disputado a tapas, tiros, facadas e, agora, cadeiradas, vale lembrar aos candidatos a prefeitos e vereadores que está proibido dizer uma mentira que não se possa provar até o próximo dia 6, data do primeiro turno das eleições municipais. Sei que é besteira esse tipo de lembrança, pois faz parte do DNA das pessoas que se predispõem a disputar cargos eletivos esgotar seus estoques de verdade antes do tempo normal. Infelizmente, mentir é o primeiro, o segundo e o terceiro fundamentos do jogo político. Como 50% dos candidatos são falsos e os outros 50% não merecem 100% de confiança, aposta quem quer.
O período político é algo que não desejo a nenhum habitante de outros mundos. É justamente quando nos cansamos de ouvir a mesma ladainha de homens e mulheres que nunca vimos, mas sobre os quais paira a certeza de que eles e elas têm horror ao trabalho. Falam tudo que sabem que os brasileiros querem ouvir. Acho até que, para homenageá-los, o jornalista Millôr Fernandes cunhou uma de suas mais célebres expressões: “Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem”. Verdade absoluta na estação em que se mente no Brasil.
Infelizmente, a temporada de caça ao eleitor brasileiro ocorre a cada dois anos. É quando os gênios que poucos de nós reconhecem saem às ruas para, assim como faz o diabo em épocas de repovoamento do inferno, citar e recitar todas as escrituras que lhes convém. Candidatos de um lado e eleitores de outro comprovam a tese de que sexo e política são as únicas atividades que podem dar prazer a duas pessoas que se conheceram por meio de santinhos ou que se detestam por conta de antigas promessas não cumpridas.
Lembrando que político eleito e foguete não têm ré, o povo precisa assimilar os ensinamentos de quem já foi eleito e entender que os políticos são funcionários públicos. Entendida a primeira lição, a segunda é pararmos de adorá-los como deuses para que sejamos respeitados. Mais importante de todas, a terceira é fiscalizá-los de modo a não cairmos novamente em um conto do vigário. Eternizada por Luís de Camões em Os Lusíadas, a frase “O fraco rei faz fraca a forte gente” parece ter sido escrita para nos despertar do profundo sono da inércia.
Uma das maiores mazelas do Brasil na atualidade, a mudança climática é ignorada por boa parte dos candidatos a prefeituras, notadamente das capitais que vêm sofrendo com as queimadas. Alguns fazem pior e apoiam publicamente projetos criminosos que limitam espaços de florestas em favor da especulação imobiliária. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara está pronta para votar uma dessas propostas. Refiro-me ao PL 4379/2020, de autoria do hoje senador Izalci Lucas (PSDB) e da deputada Bia Kicis (PL), ambos representantes do Distrito Federal.
Sem projetos, discursos e roteiros, mas com violência e um desejo insano pelo poder, candidatos da direita, da esquerda e dos extremos abaixo da linha da razão estão loucos para desativar a principal arma do bom eleitor. Sabedores de que não podem comprar o voto consciente, apostam as fichas que não têm no sufrágio inconsciente. Que me perdoem os que não sabem o que fazem, mas não custa repetir que somos o reflexo de nossas escolhas. Nos 5.570 municípios brasileiros estão suspensas as garantias da honra, da probidade e da verdade. Neles, os candidatos chovem, os eleitores pululam e o resultado preocupa. Feche os olhos, vote e jamais esqueça que eleição e mágica são muito parecidas: em ambas são visíveis os movimentos, as formas e o tom das tramoias.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978