Mais do que atender à ganância por verbas e cargos dos partidos aliados, qualquer reforma ministerial serve para aparar arestas entre os colaboradores, afastar aqueles que, por razões diversas, não cumprem as determinações do presidente e trazer para o ninho governista parlamentares simpáticos a projetos de interesse do governo. Às vezes, a renovação de assentos também inclui os que já incomodaram politicamente. É o caso de deputados e senadores alinhados ao Centrão e ao bolsonarismo. Enfim, não há preocupação alguma com a meritocracia, muito menos com o povo. É o vale tudo pelo Lula 4 ou por um sucessor de sua preferência.
Obviamente que o sistema presidencialista impõe esse tipo de casamento sem o compromisso da fidelidade. Sem as alianças, o isolamento do governo deixa de ser expectativa. Por isso, vale colocar na balança o que pode contribuir e o que deve dividir. O compartilhamento da agenda do presidente com pessoas de ideologias e propostas diferentes certamente irá de encontro às bandeiras e discursos caros à esquerda. Caso isso ocorra, o futuro de controvérsias progressistas, avaliado hoje como uma marolinha, tende a se transformar em um tsunami eleitoral. Na ânsia de correr atrás do próprio rabo, Lula da Silva esqueceu em um dos armários do Planalto um de seus maiores cacifes eleitorais de 2022: o povo nordestino.
É esperar para ver se a vidência da governadora do Rio Grande do Norte, a petista Fátima Bezerra, se confirmará ou não. Conforme a governadora, o apoio do Nordeste a Lula em 2026 não está garantido. E tudo por conta da ausência do governo do PT na região. Aos companheiros mais próximos, Luiz Inácio tem dito que a reforma ministerial anunciada deve ser mais enxuta do que o mercado, a sociedade e os políticos imaginam. Segundo Lula, haverá o troca-troca, mas o “ideal é manter boa parte do time “. A fala do líder petista indica que, ao contrário do que o Brasil inteiro está assistindo, ele acha que o time está vencendo. Não está. Aliás, desde a posse, em janeiro de 2023, perdeu mais do que ganhou.
Portanto, mudar apenas para ganhar é passar recibo de que o treino, a concentração e a preleção com os ministros foram e permanecem inúteis. Após dois anos de preparação e de adestramentos, sobram críticas e faltam políticas públicas e o controle real da inflação decorrente do preço dos alimentos de primeira necessidade. Acredito que o mandatário deve ter sido informado que a dificuldade do povo para se alimentar é o que mais contribui para corroer a aprovação de qualquer governo. O Lula 3 não está conseguindo segurar a onda. Pode ser uma injustiça afirmar que ele é o único culpado pela crise de preços enfrentada pela sociedade. Então, de quem é a culpa? Não é do eleitor.
A reforma ministerial talvez seja a bala de prata sonhada desde que a direita menos conservadora recolheu as cartas dos extremistas na eleição municipal do ano passado. Se não for a bala de prata, diria, como dizem nos jogos de sinuca, que o Lula 3 está pela bola 7. Os novos atores mostraram a cara, deram o pé e agora “exigem” cadeiras mais altas no redesenho do governo. É um jogo perigoso, na medida em que a desnecessidade de uma combinação com os russos, hoje denominados eleitores, pode gerar efeito contrário ao esperado pelo presidente da República. A reforma pode ser positiva do ponto de vista do apoio entre os parlamentares, da redução das críticas em plenário e, principalmente, do enfraquecimento das siglas vinculadas à extrema-direita.
Entretanto, como explicar ao eleitorado progressista que, pelo menos a curto e médio prazos, a mexida não irá resolver o maior problema do país nos dias de hoje: o medo de se aventurar em um supermercado. Da metade para o fim do governo, Lula sabe que não pode mais errar. O recado das pesquisas é mais do que claro. O descontentamento da população é crescente. Este mês de janeiro tem de ser visto com uma senha. Pela primeira vez em dois anos os índices de reprovação foram maiores do que os de aprovação. Isso quer dizer que o povo cobra resultados. E rápido. Ou eles aparecem ainda no limiar de 2025 ou 2026 chegará com a sintonia entre Lula e seus eleitores mais atravessada do que o som de um bumbo tocado por surdo com partitura escrita em braile.
…………………….
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978