Os piratas comandados por Capitão Gancho ameaçam a família da jovem Wendy quando Peter Pan surge inesperadamente cruzando os ares, dando cambalhotas e provocando os jovens malfeitores. O efeito impressiona, pois Mateus Ribeiro, no papel de Pan, realiza verdadeiras acrobacias áreas, como se não estivesse preso a cabo algum. “Aprendi a dançar sem solo”, brinca ele, um dos destaques de Peter Pan, luxuoso musical inspirado na montagem da Broadway que ganha versão nacional e estreia na quinta-feira, 8, no Teatro Alfa, em São Paulo.
Trata-se de uma produção híbrida se comparada à original. Afinal, se traz elementos da versão americana, é completamente inovadora ao acrescentar elementos inéditos que fazem a diferença. Um deles é a maior mobilidade aérea de Mateus, que deverá até sobrevoar a plateia graças ao intenso treinamento que teve com a americana Andrea Gentry. O resultado é um verdadeiro balé aéreo. Outro é a presença de uma atriz, Mariana Amaral, no papel de Sininho – pelo mundo afora, a personagem da pequena fada é sempre representada por um facho de luz. “Como fã da história, eu não me conformava por não ver a Sininho”, brinca a produtora Renata Borges, da Touché Entretenimento. “Para isso, conseguimos a liberação da MTI para apresentá-la em tamanho natural.”
Renata revela-se obcecada pelo trabalho, buscando sempre um detalhe que transforme sua montagem em algo original. Autorizada a captar até R$ 16 milhões pelas leis de incentivo, ela buscava um espetáculo familiar. O que explica o rigor técnico da produção. Renata, por exemplo, se satisfaz com contradições – como a de tornar cada vez mais verossímeis elementos de contos de fada.
É o que explica, por exemplo, a confecção de um crocodilo em tamanho original. O enorme bicho que comeu uma das mãos do Capitão Gancho (e agora o rodeia em busca do restante) anda para frente e para trás, além de abrir a enorme bocarra. “Foi construído fora do País”, conta a produtora, autora da ideia.
São detalhes que satisfazem o público ávido por superproduções, mas o grande trunfo de Peter Pan é seu elemento humano. Além de Mateus, que confere graça e rara leveza ao papel do menino que não quer envelhecer, há ainda Bianca Tadini e sua voz encantadora como Wendy e, principalmente, Daniel Boaventura no papel de Gancho.
Experiente em musicais (A Bela e a Fera, Chicago, Família Addams), Boaventura exibe seu imenso arsenal humorístico para construir um personagem ao mesmo tempo histriônico e hilariante. E seu trabalho ganha ainda mais relevância graças ao jovem que interpreta Smee, o primeiro assistente de Gancho. Naturalmente engraçado, Pedro Navarro confere o tom certo do serviçal atrapalhado. “Ele é um parceiro perfeito no jogo cênico”, elogia Boaventura.
Para contar a história da Terra do Nunca, habitada por crianças que não querem envelhecer, o diretor José Possi Neto percebeu que o vigor físico seria primordial no desenho do espetáculo. “Trata-se de um musical em que os personagens falam por meio do corpo”, observa ele que, experiente na dança, conferiu um tom de balé às movimentações.
Nesse caminho, entram no mesmo passo o coreógrafo Alonso Barros e o diretor musical Carlos Bauzys, que contribuem para que o ritmo, embora frenético, seja controlado. Barros, por exemplo, criou movimentos que ressaltam o tom juvenil dos personagens e sua energia infinita. “A linguagem é, realmente, corporal, o que faz com que todos os atores tenham uma necessidade atlética”, observa. Já Bauzys cuidou para que as notas musicais identificassem o papel de cada um. “Precisei modular os tons (grave para os piratas, agudo para os meninos perdidos) para marcar as diferenças.”
O elenco de 18 intérpretes responde com vigor, garantindo o equilíbrio. “Trabalhamos juntos já desde a audição”, conta Pedro Navarro, substituto de André Dias (que não pôde se unir à produção) e hoje elemento indispensável. Assim como Mateus Ribeiro que, mesmo com diversos ferros presos ao corpo, que lhe permitem dar um total de nove sobrevoos, convence o espectador de que não existe limite entre o céu e a terra.