Caras de pau
PF caça homens de ouro que levariam 4,2 bi de 213 milhões de brasileiros
Publicado
emMinha avó dizia que pau que nasce torto, morre torto e até a cinza é torta. Não costumo crer em previsões, mas basta me deparar com o incorrigível, irreparável e vergonhoso ninho de serpentes peçonhentas do Congresso Nacional para ter certeza de que realmente o pau que nasce torto nunca se endireita. Definitivamente, os políticos brasileiros não merecem mais do que as páginas policiais. Farristas inveterados com o dinheiro público, dessa vez, com aval direto e explícito do presidente da Câmara dos Deputados, o manobrista Arthur Lira (PP-AL), as excelências passaram do limite.
Enquanto o país monitorava o Supremo Tribunal Federal, Lira e sua súcia do mal conseguiram passar uma boiada de R$ 4,2 bilhões em emendas secretas denominadas de comissão. Apesar das exigências judiciais de transparência, na calada da noite, no apagar das luzes do ano judiciário e com um simples estalar de dedos, o comandante alagoano burlou as regras do jogo que estava sendo jogado para atender deputados e senadores. Para isso, precisou apenas de 17 assinaturas de líderes do conchavo. Portanto, o chefe decidiu que seriam necessários somente 18 homens de ouro para sumir com uma bolada de propriedade de quase 213 milhões de brasileiros.
Para sorte dos contribuintes, o ministro do STF Flávio Dino estava com o abajur ligado no modo leitura e foi atiçado pelo pavio curto do Psol. Aí, a fogueira ardeu. Não tivesse sido flagrado com os olhos grandes e a boca na botija, o grupelho novamente jogaria para debaixo dos tapetes do país os nomes daqueles que receberiam verbas públicas. Conforme antecipei semana passada, seria a formalização da mamata oficial. Ou seja, as emendas são secretas, mas o cinismo é claríssimo. Já pensei até em seguir o conselho do falecido Leonel Brizola e criar um vergonhódromo para os políticos. Não sobraria espaço para a turma do apoio. Sinto vergonha pela falta de vergonha deles.
Aliás, diz o ditado que políticos usam muitas máscaras, uma para cada ocasião. A mais usada é a cara de pau, daquelas que nem cupim macho estraçalha. Como o erro dos espertos é achar que todos são otários, o manager do Centrão dessa vez se deu mal. Questionado pela direção do PSol, o ministro Flávio Dino voltou a entrar no circuito da malandragem do pior Congresso que o Brasil já teve. E fez isso porque havia o risco de o dinheiro sair voando pelas janelas da Casa dos Horrores e desaparecer no bolso da bizarria chamada parlamentares.
Com outra canetada, Dino suspendeu o pagamento, deu cinco dias de prazo para a Câmara se explicar e, obviamente, exigiu transparência no repasse das emendas. Boa parte das verbas estava em vias de ser descarregada em Alagoas. De tão absurdas, as irregularidades mereceram ação mais enérgica do ministro. Além de travar o pagamento, Dino também ordenou que a Polícia Federal abrisse (como abriu) um inquérito para investigar a maracutaia e a manobra supostamente planejadas pelo presidente da Câmara. Como se acham donas do mundo e não aceitam ter suas imoralidades contrariadas, as excelências já prometeram o troco.
Parece brincadeira, mas é séria a forma como os legisladores de araque tentam nos enganar com versões diferenciadas. Ainda mais séria é a capacidade deles se reunirem para ameaçar autoridades de outros poderes que só estão cobrando transparência em algo que os deputados insistem em esconder. Triste, mas verdadeiro, o pior de tudo é perceber que o mau exemplo vem justamente daquele que deveria ser um exemplo para os demais. O Brasil inteiro espera que a expectativa do deputado Glauber Braga (Psol-RJ) se transforme em realidade e que Arthur Lira seja exemplarmente responsabilizado pela manobra. A maldição de Brasília o espera. Nada demais para quem se acostumou a entrar e sair pela porta dos fundos.
……………………………….
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978