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Pililico, o gato de rua que ganhou casa e devora petiscos de salmão

Tanto nome, e a minha filha calhou de colocar o nome do gato de Pililico. Nem sei se ele gosta, ao menos não faz a menor questão de demonstrar, ainda mais porque nunca atende. Quer dizer, se coloco uma sardinha no seu prato, o bichano vem correndo, aquele rabo felpudo em pé. Passa por entre as minhas pernas, provavelmente como forma de agradecimento. Se bem que já me falaram que felinos são indiferentes, que fazem o que querem, que são preguiçosos e só se aproximam quando desejam algo.

Espécie mais esquisita. Vai ver que é por isso que escritores gostam tanto. Sei que o Daniel Marchi adora, inclusive teve uma de nome Sula. Será que ela atendia ou, então, era da estirpe do Pililico? Desconfio que o Daniel, apesar de poeta e escritor talentosíssimo, era feito de gato e sapato pela bichana.

Mas voltemos ao gato daqui de casa. Antes é melhor falar um pouco sobre a Margô, minha filha que, aos seis anos, mal sabe pronunciar paralelepípedo, quanto mais inconstitucionalissimamente. Talvez seja por isso que ela tenha escolhido esse nome tão incomum para um bichano.

Pois voltemos, direto do sofá da sala, cheio de marcas de unhadas do Pililico. Eis que cá estou tentando entender como é que esse móvel, que me custou os olhos da cara, e que eu esperava ser o local para me esparramar logo após os almoços de domingo, foi se transformar em propriedade desse sujeito que nem sequer atende pela alcunha de Pililico. Um déspota!

Minha mulher parece que resolveu tomar partido do salafrário, tanto é que, vez ou outra, me telefona para que eu não me esqueça de comprar petiscos para o gato. Pior! O pilantra ainda tem o paladar mais exigente do que o meu.

— Júlio, de salmão! Caso não tenha, traga de carne, mas não de frango, que o Pililico não gosta.

E lá vou eu atrás de quitutes para um bicho que, até há pouco tempo, vivia nas ruas correndo atrás de ratos para sobreviver. Antes a Margô tivesse encontrado um cachorro. Bastaria pedir um osso no açougue da esquina para fazê-lo feliz.

Enquanto tento concluir minhas lamúrias, o Pililico me encara. Ele aperta os olhos, ao mesmo tempo em que se espreguiça todo. Nisso, o safado se aproxima e começa a se esfregar nas minhas pernas. De repente, pula no meu colo e começa a ronronar. Logo estamos nos encarando. Não resisto e acaricio seu pelo. Poxa, como o danado é bonito!

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*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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