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Balela anedótica

PL quer amar o Nordeste até que a eleição os separe

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Jr - Foto de Arquivo

Duas semanas após um de seus membros expor ao Brasil e ao mundo seu perfil de legenda sectária, misógina, homofóbica, racista e golpista, o Partido das Lágrimas (PL), de maioria bolsonarista, decidiu fazer um mea-culpa. Depois que o deputado goiano Gustavo Gayer comparou os nordestinos a galinhas, o partido da boquinha parece disposto a conquistar os nove estados do Nordeste, os quais garantiram a vitória de Luiz Inácio em 2022. A ordem do presidente da sigla, Valdemar Costa Neto, é esquecer o passado de hostilidades físicas, sociais, emocionais e financeiras ao povo local e partir para o tardio abraço de tamanduá. Algo como jura de amor eterno até que a eleição os separe.

Inicialmente, a preocupação é dar maior nitidez ao viés programático e ideológico da legenda. Será que alguém do Nordeste ou do restante do país desconhece o que defende e o que representa o PL? Concordo em tese que o PT já foi sinônimo de mensalões e de mensalinhos. Talvez ainda seja. No entanto, é uma balela anedótica tentar vincular o PL à honestidade e desvinculá-lo do atraso, do golpismo, do despotismo e do conservadorismo criminoso. É o que sempre digo e repito: entre o ladrão e o tirano, fico sempre com o ladrão, cuja prisão pode mudar seu modus operandi. O ditador não tem limites.

A ideia de convencimento sobre o repentino altruísmo do PL deve começar nas eleições municipais de outubro próximo. O cabo de guerra será lançado em Maceió, única das nove capitais da região onde Bolsonaro venceu. Senador pelo Rio Grande do Norte, Rogério Marinho foi o escolhido para apresentar o PL ao eleitor quase impedido de votar em 2022, fazer frente ao PT e tentar abrir caminho para a próxima disputa presidencial, em 2026. A tarefa será das mais inglórias, na medida em que não há nenhuma afinidade entre as propostas do PL e os anseios dos nativos. Ou seja, na melhor das hipóteses, o interesse dos parlamentares vinculados ao bolsonarismo é temporário.

Se alguém duvida disso, eu não. O ódio e a patética necessidade de exclusão estarão de volta imediatamente após a divulgação do último voto pela Justiça Eleitoral. Quem não se lembra da vocação da direita bolsonarista em trabalhar ontem, hoje e sempre para evitar o crescimento educacional e socioeconômico dos nordestinos. Nunca nenhum de seus representantes atuou em questões que pudessem ser essenciais para a região crescer. Cumprida à risca por décadas, a meta histórica da elite sulista e do Centro-Oeste foi – e é – manter a população nordestina sob cabresto.

Os tempos são outros. Mesmo sob protesto dos capatazes do conservadorismo, o nordestino se cansou de ser invisível, adquiriu valores e conceitos novos e mandou às favas os herdeiros da bestialidade das ditaduras falsamente travestidas de democracias. Como no poema E agora, José, a festa acabou. As enganadoras doces palavras viraram água salobra e hoje não passam de discursos avinagrados. Enfim, passou a época em que imagens hipocritamente retocadas significavam poder e ganhavam eleições. Maquilagens com rouge, blush ou pancake da Avon não cobrem mais os rostos desfigurados pela maldade dos rufiões da direita.

De boa memória, poucos são os nordestinos trabalhadores que ainda se encantam com homens da cobra, vendedores de bilhetes premiados, bruxas, duendes, faquires e, principalmente, com mitos que mais parecem espumas ao vento. Acentuado desde o segundo turno das eleições gerais de 2022, quando muitos foram impedidos de votar, o atual modismo na região é o combate à vilania representada pelo PL. Portanto, hiperbolicamente chorem rios de lágrimas, mas, se puderem, não esqueçam que um dia vocês compararam idiotamente o povo do Nordeste com galinhas. Podem ser, mas não são de qualquer poleiro.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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