Apito de cachorro
Política do dog whistle alimenta ativismo de extrema direita
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emUma mensagem política empregando linguagem em código que parece significar uma coisa para a população em geral, mas tem um significado mais específico e diferente para um subgrupo-alvo. A expressão é a tradução literal do inglês, dog-whistle politics ou o apito de cachorro, e foi acionado por Elon Musk recentemente, após o bilionário perceber que, caso não se posicionasse, seus negócios e empresas no Brasil – a SpaceX, a Starlink e a Tesla – poderiam sofrer perdas grandiosas e globalizadas.
Uma das fornecedoras das empresas de Musk é a brasileira Vale, que vende lítio e níquel. O lítio – metal mais leve que existe -, é considerado o “petróleo branco”. O material é essencial na produção de baterias, energia solar e eólica, além dos carros elétricos. Numa tentativa de proteger seus interesses comerciais, Musk ataca no melhor estilo “dog-whistle politics”: apitou e foi ouvido. Ele agora está usando desse poder comunicacional – que tem com a rede X – para tentar desestabilizar o país e impulsionar seus próprios negócios, pois o que lhe simpatizava já saiu do comando.
Fato semelhante ocorreu na Bolívia, em 2020, quando Elon Musk também se envolveu em uma intromissão com o governo e instituições do país semelhante à que vem sendo feita no Brasil. O tema ficou urgente para o bilionário: neste ano, entrou uma concorrente chinesa no jogo e pode “melar” os negócios dele por aqui.
O Brasil é uma das peças do tabuleiro da guerra comercial, já que virou centro da estratégia global de investimentos da BYD. A empresa anunciou que vai ampliar seus investimentos no país em até 1 bilhão de euros. Em outubro do ano passado, a BYD assumiu a fábrica da Ford em Camaçari, na Bahia – fechada no governo do ex-presidente Bolsonaro – que pouco ou nada fez para evitar a saída da Ford do país. Agora, a BYD se prepara, e terá capacidade inicial para produzir até 150 mil veículos por ano. Se no Brasil a BYD ganha terreno, o cenário é ainda mais preocupante para Musk no restante do globo.
O apito de cachorro foi dado e apoiadores do então ex-presidente Jair Bolsonaro atenderam ao chamado do bilionário do X e disseram: Vamos entrar nisso… porque, segundo eles, ativistas de extrema direita, de um lado a justiça brasileira está determinando a exclusão de conteúdos envolvendo a disseminação de fake news, ferindo o grupelho de morte; de outro, os Arquivos do Twitter, divulgados pela primeira vez, puseram-se a revelar descaradamente que Alexandre de Moraes e o Tribunal Superior Eleitoral estavam envolvidos em uma clara tentativa de minar a democracia no Brasil. Não deu outra: dog-whistle politics de um lado e o MP do outro e o TCU declarando guerra aos negócios de Elon Musk no país, buscando anular eventuais contratos existentes da Starlink com o governo brasileiro e ainda analisar o bloqueio do X no Brasil.
Algumas das características comuns do ativismo de extrema direita incluem tendência a apoiar líderes fortes e centralizados, muitas vezes desconsiderando as instituições democráticas em favor de um governo autoritário – e era isso que os ditos conservadores no Brasil estavam fazendo (de 2018 a 2022) mas, foram contidos com o pleito eleitoral que deu vitória a um outro Brasil que não apoia a dog-whistle politics.
É importante notar que o conservadorismo não é uma ideologia monolítica, e há uma variedade de perspectivas dentro do espectro conservador, incluindo conservadores sociais, conservadores fiscais e conservadores libertários, cada um com suas próprias ênfases e prioridades políticas. O ativismo de extrema direita é caracterizado por uma série de características e comportamentos que refletem uma visão política radicalizada e, muitas vezes, autoritária.
Embora as especificidades possam variar dependendo do contexto cultural e político, algumas das características comuns do ativismo de extrema direita incluem o nacionalismo extremo. Porém, ele não existe quando o espelho somos nós mesmos, cuja soberania interna do Brasil, por exemplo, é diariamente desafiada pelas facções criminosas que dominam os presídios, territórios urbanos e agora estendem os seus tentáculos à política.
*João Moura é observador da anatomia de governos e sociedade.