Como afirmou Nelson Rodrigues mais de uma vez, o canalha é uma figura de incalculável riqueza interior. Ele possui uma complexidade que falta justamente ao justo, ao virtuoso e ao honrado. E, convenhamos, é até reconfortante (segundo Nelson) encontrar uma dessas criaturas que encerram toda a variadíssima sordidez da condição humana.
Enquanto o canalha é difícil de ser descoberto – afinal, ninguém quer ser um canalha, ainda mais assumido – o político, principalmente o político canalha, é descaradamente patife.
O político canalha, diferentemente do simples e mortal canalha, que se esconde atrás de borrões de honestidade, desde sempre autoriza: “Cuspam-me na cara! Eu sou um canalha abjeto”. Em sua maravilhosa desfaçatez, por baixo de uma lustrosa cara-de-pau, nunca se deixará levar pelo nojo de beijar uma criança remelenta e acatarrada. Comerá pastéis gordurosos, bebendo caldo de cana em copos de plástico. Partilhará, prodigiosamente, apertos de mãos e abraços em gente pobre e malvestida, distribuindo sorrisos que fariam inveja aos comerciais de dentifrícios. Barganhará o maior valor possível na hora de receber a propina, mas se contentará com os 10% oferecidos pelo corruptor. Destruirá nobres preceitos bíblicos: mentirá, roubará e prevaricará. Se o manto da sua canalhice cair, chorará publicamente, jurando pelos filhos, pelos pais e pelo país.
Entretanto, a inveja em relação ao político canalha é patente, afinal, quem tem inveja do honesto pobre e malsucedido? Os sujeitos honestos existem às pencas. Eles estão nas favelas, cidades e estados brasileiros. Frequentam filas de hospitais, acordam cedo, enfrentam conduções lotadas e caras, são assaltados por bandidos e achacados honestamente pelo governo, pagando impostos exorbitantes.
Você, que se esconde atrás do manto da honestidade, não se engane! Você não é um canalha de primeira linha. Aprenda com os políticos! Assuma a sua canalhice e torne-se um canalha de estirpe.