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Políticos usam cinismo e desfaçatez como armas

Escrever sobre política ou a respeito dos políticos é um filão inesgotável. Pode ser uma mesmice – e é -, mas é uma tema que assombra pela repetição de atos e fatos que passam longe do conceito de representatividade e gerenciamento do termo política. Políticos deveriam representar a população, bem como gerenciar os negócios públicos. No Brasil, os valores são invertidos. Por aqui, são políticos aqueles que, não sabendo fazer mais nada, se servem dos poderes que a política lhes dá, consequentemente do mando constitucional que conseguem para se “governarem”. E fazem isso com invejável maestria, algo bem distante do que pregava o filósofo grego Aristóteles, para quem a política tinha ares bem definidos de uma ciência exata em que a felicidade humana seria o principal objetivo.

Meu caríssimo Aristóteles, seria, mas, pelo menos na republiqueta de bananas, nunca foi. E jamais será. Na Terra Brasilis, o que vale é a máxima do “vô se dá bem”. É a brutalidade do cinismo, da arrogância e da desconsideração com a massa que os elege. Aliás, para a maioria esmagadora dos políticos, o povo é pior do que apenas um detalhe. Na concepção criminosa de quem só pensa em si, talvez o cidadão comum, também conhecido por eleitor, seja mesmo inferior à gentalha com a qual ele (o político) convive de vez em quando nos plenários do Congresso, das assembleias legislativas ou das câmaras municipais.

De vez em quando porque nem para o convívio diário eles foram feitos. São párias da sociedade, embora se achem suprassumo dessa mesma coletividade, ou seja, o ponto máximo do ser humano. Portanto, ainda que nem sempre acorde com a intenção de rascunhar alguma coisa da política brasileira, normalmente sou obrigado a narrar o que os políticos fazem de mais brilhante no dia a dia das chamadas casas do povo: brincar com a saúde, segurança, educação, lazer, trabalho e previdência social de 213,3 milhões de pessoas. Na verdade, nem coram a cara de pau quando são cobrados pela falta desses direitos sociais fundamentais e que deveriam ser a razão da existência de qualquer parlamento. Infelizmente, nunca chegaram nem perto. São casas mal assombradas, majoritariamente ocupadas por comediantes mal sucedidos.

Por isso é que, depois de reagir por algum tempo, resolvi aderir à teoria de um velho amigo de redação, cuja prática é compor um texto com o mesmo cinismo dos que produzem as informações repassadas a jornalistas e à população. Segundo esse antigo companheiro (ainda hoje amigo do coração), escrever com pitadas de filosofia, ideologia ou benevolência é o mesmo que admitir complacência, pacatez ou fisiologismo. No português mais escorreito, temos de ser cínicos para aceitar e tentar compreender a hipocrisia e a desfaçatez alheia. Um dos maiores exemplos da desnecessidade de usarmos de candura ou pudor para referências aos políticos me foi dado por um outro amigo muito querido e companheiro de memoráveis manhãs nos trabalhos sociais na oncologia do Hospital de Base de Brasília.

De acordo com meu parceiro, a ocasião realmente faz o ladrão. Claro que o mote desta narrativa ou do exemplo do amigo não é roubalheira, mas o registro político da conveniência e da hipocrisia. Beatos recém-canonizados, novos amigos do coração e figuras de proa da CPI da Covid, os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP) nem sempre andaram de braços dados, muito menos trocavam elogios em épocas remotas. Pelo contrário. Um só não chamava o outro de santo. Apenas como lembrança, em passado recente, após ser acusado por Renan de nebulosidades em sua vida pregressa, Randolfe foi o grande defensor da proposta de voto aberto na eleição para presidente do Senado, de modo a inviabilizar a candidatura do agora amiguinho de acusações (todas justas) ao presidente da República.

O argumento era o rosário de acusações contra o senador alagoano. O atual idílio é a prova de que, como dizia Ulysses Guimarães, política é a arte do possível. Improvável é imaginar que o novo “casal de periquitos” (definição do amigo tarefeiro) se mantenha unido pelo menos até o próximo pleito. Portanto, melhor incorporar Raul Seixas e entoar intimamente um dos mais fortes versos das canção Tente outra vez: “Se é de batalhas que se vive a vida, tente outra vez”. E tentemos quantas vezes forem necessárias. Somos capazes de “sacudir o mundo”. O sonho não acabou. Tomar conhecimento do custo da eleição do deputado Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara e não reagir é passar recibo de nossa mesmice política. Sinônimos de cinismo, o descaramento, a audácia e o descaso dos políticos só acabarão quando nossa coragem for maior do que o medo e nossa força tão grande como nossa fé. Pensemos nisso para 2022.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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