Cristiano Nabuco
Há cerca de duas décadas foi criada a expressão ”Psicologia da Internet” para explicar a razão pela qual o comportamento das pessoas se altera tanto dentro dos ambientes virtuais.
Qualquer um que já navegou na web percebeu alguma modificação, ainda que mais leve, em sua conduta ou ação.
Por ser um espaço muito atípico e diferente de tudo que já experimentamos na vida concreta, descobriu-se que a realidade paralela exerce um tipo de “dinamização” da personalidade, o que coloca as pessoas em inclinação para atitudes de maior risco e de descontrole calculado, se comparadas ao que se vive no nosso dia-a-dia.
A respeito desse fenômeno, criou-se um termo para melhor definir tais alterações comportamentais: “efeito de desinibição online”, explicita, portanto, a variação de padrões.
Pesquisas demonstraram que essas alternâncias da vida off-line para a vida online se baseiam nas seguintes crenças:
(A) “Você não sabe quem eu sou e não pode me ver”: à medida que as pessoas navegam na internet, obviamente que não podem ser “vistas”, no sentido literal da palavra – diferentemente de como ocorre no mundo concreto -, conferindo então aos internautas a falsa percepção de que eles estão anônimos e, por esta razão, não há limites ou regras associadas ao comportamento online. Este fato também é descrito na literatura psicológica como ”desindividualização”, ou seja, um estado de dissipação da identidade real e que favorece o aparecimento de maior grau de insubordinação, agressividade e sexualidade exacerbada, se comparado ao que ocorre na vida concreta.
(B) “Até logo” ou “até mais”: a internet, querendo ou não, uma vez que permite aos seus usuários escaparem facilmente das situações mais embaraçosas, leva-os a correrem mais riscos e tolerarem melhor as situações de ameaça. Como não existe uma consequência imediata dessas ações virtuais (na verdade “existe” uma consequência, todavia, ela é mais demorada para que os resultados apareçam), as pessoas então se tornam mais flexíveis a respeito das transgressões.
(C) “É apenas um jogo”: esta premissa dá ao usuário a ilusão de que o mundo online opera, na verdade, em condição de fantasia, e que ninguém, de fato, seria prejudicado pelas “aventuras” realizadas no mundo digital. Assim, a linha divisória entre a ficção e a realidade torna-se facilmente mais turva, uma vez que existem centenas de atividades que, na verdade, “não existem” na realidade concreta.
(D) “Somos todos amigos”: cria a ilusão de que na vida paralela da internet, somos todos iguais ou amigos, uns com os outros e que, portanto, as regras que determinam as relações adequadas entre os diferentes grupos (por exemplo, crianças, adolescentes e adultos) existentes no mundo real podem ser simplesmente desconsideradas. Este princípio também tem o poder de diluir as hierarquias existentes entre diferentes indivíduos na sociedade, favorecendo aos comportamentos de maior desrespeito e falta de cuidado interpessoal que tanto se observa nas redes sociais e nas comunicações entre funcionários de uma empresa.
Portanto, o “efeito de desinibição online” descontrói os ambientes formais e mais rígidos da realidade concreta para liberar o indivíduo ao trânsito nos espaços altamente permissivos, tornando as pessoas mais condescendentes e altamente plásticas em relação às transgressões.
Vamos lembrar que todo esse processo já tem um nome e se chama “personalidade eletrônica” (e-personality).
Imagine então, as crianças e jovens ainda em processo de formação, o que o ambiente virtual poderia fazer com a consolidação de sua personalidade (ainda) em definição?
No final das contas, pensam muitos pais desavisados: “é apenas videogame” ou, ainda, “eles só estão usando uma rede social”, que problema haveria com isso?
No passado não muito distante, o desassossego familiar vinha das amizades inadequadas, hoje deriva do próprio indivíduo em sua relação consigo mesmo no ambiente virtual.
Para se pensar, não acha?…