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Democracia sem canhão

Por que ter benevolência com quem não é merecedor?

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Mathuzalém Júnior - Foto Antônio Cruz/ABr

Manifestamente tenho pouca ou nenhuma simpatia pela esquerda, hoje com atividades mais festivas do que funcionais. Sobre a direita, prefiro não comentar, tampouco descrever. Meu problema tem sido o povo, principalmente aquele que faz questão de se autointitular eleitor consciente. Tenho muito medo da consciência deles. Na verdade, tenho receio deles por inteiro. De vez em sempre acho que as incoerências e as contradições da população brasileira com esse perfil mereceriam teses de doutorado em Harvard e na Sorbone e, se houvesse disponibilidade, de estudos aprofundados da Nasa.

Cheguei a essa conclusão após ouvir com relativa frequência que os terroristas do 8 de janeiro de 2023 são vítimas de um sistema jurídico apodrecido, injusto, ideológico e manipulador. Culpam principalmente o ministro Alexandre de Moraes, considerado pelos “patriotas” como um magistrado fora da curva e do seu tempo. Estranho que pensem assim, pois os invasores dos prédios do Supremo Tribunal Federal, do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional não são meninos levados e mimados.

Pelo contrário. Tiveram liberdade suprema para protagonizar a barbárie. Sem preocupação alguma com o politicamente correto, todos os que participaram do ato de vandalização da República são fora da lei e inescrupulosos e como tais devem ser tratados pela Polícia Federal e pelos homens da capa preta. Eles querem a benevolência da lei, mas certamente não teriam nenhuma humanidade, altruísmo ou compaixão se tivessem se encontrado pelo caminho com Luiz Inácio, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes. Alguém duvida disso?

Então, por que querem receber o que não dariam? É o antagonismo entre a lei de causa e efeito e a de reciprocidade. Boa parte da ratatuia que insiste como o poder defende anistia para os bandoleiros da Praça dos Três Poderes. Curiosamente, são os mesmos que fecharam questão com o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), autor do projeto de lei que prevê a castração química voluntária para estupradores reincidentes. Os vândalos também são reincidentes. Quem não se lembra da tentativa de invasão da sede da Polícia Federal no dia da diplomação de Lula como presidente eleito democraticamente?

É a velha tese de quem apanha jamais esquece. Reconheço e entendo a falta de repertório da direita. Por isso, a esquizofrênica ladainha dos “patriotas” sobre um único tema. Aliás, três. Os outros dois são o rame rame da volta do voto impresso e o pouco caso com a estabilidade política que vivemos sem o pesadelo do golpe. Pensem grande e perceberão o tamanho do retrocesso que é a proposta de violentar o sistema eletrônico de votação. Quanto ao período de paz, basta lembrá-los do pleno funcionamento dos três poderes da República.

Para aqueles que estavam certos dos passamentos de Lula, de Alckmin e de Xandão, não havia hipótese de um ressurgimento colossal da esquerda. Deram com os burros n’água e tiveram de passar da expectativa à realidade bem antes do que imaginavam. Daí a surpresa com a robusta saúde do presidente que não conseguiram matar, com a prisão de militares estrelados e, principalmente, com a consolidação da democracia sem canhões.

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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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