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Olho em 2022

Povo corre risco de comprar chester e levar galinha preta

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto Isaac Nóbrega

O que é bom dura o tempo suficiente para não ser esquecido. O contrário também é verdadeiro. O que lembrar de um governo que não existiu? O que dizer de um mandatário que não mandou, embora tivesse a caneta, o fuzil, os seguidores fanáticos e o Centrão sempre por perto? Pouco, muito pouco, quase nada. Desde os primeiros passos políticos, já ouvi e assisti de tudo um pouco na Terra Brasilis. Vivi a ditadura, conheci de perto Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, torci contra o Colégio Eleitoral, jamais vi honestidade em Paulo Maluf e vibrei pelas Diretas Já. Apaguei do currículo, mas não posso omitir uma rápida subordinação hierárquica a Orestes Quércia e Múcio Athayde, ambos antigos parlamentares do velho, indecifrável e, já naquela época, apodrecido PMDB.

Também imaginei mil e uma mudanças com a ascensão da esquerda. Experimentei algumas, entre elas a democracia a qualquer custo. Depois de mazelas históricas e com a elevação de numerosos aproveitadores soturnos, imaginei que o Brasil havia atingido a idade da razão, que enfim tinha conquistado alguma maturidade política. Ledo engano. Talvez tenha de viver mais 100, 150 anos para alcançar o sonho dourado da democracia plena, da consciência eleitoral e, sobretudo, da renovação da esperança. Após fantásticas expectativas de ter voz entre os países mais ricos do planeta, bastou uma eleição para que o país hibernasse e recuasse preciosos anos no tempo do mundo.

O gigante chamado Brasil voltou a adormecer. Parte do povo emburreceu politicamente. Abandonamos o bordão país do futuro e voltamos a ser o que fomos durante décadas: um amontoado de gente sem rumo, sem proteção e sem governo. Precisamos voltar a ser uma nação. Temos obrigação de eleger um presidente preparado para ouvir assessores e capacitado para enfrentar os solavancos econômicos, as intempéries da natureza e, principalmente, as insolúveis desigualdades sociais. O passo inicial é pensar bem antes de escolher o primeiro que nos oferece flores murchas ou bombons estragados.

Acreditar em mitos pode ser sinônimo de desgraça administrativa ou devastação de uma economia que até recentemente parecia pujante. As eleições de 2022 deveriam representar um recomeço. Tomara que sim. Quem sabe não comecemos por uma limpeza no Congresso Nacional, há muito sem ideologia e avaliado como inimigo do povo. É uma tarefa interessante e imperativa para quem deseja um país sério e distante da corrupção. Perdão pelo sincericídio, mas faltam deputados e senadores dispostos a, por exemplo, se manifestarem contra um fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões.

Sobram parlamentares tão ocupados em aprovar o fundão e deliberadamente despreocupados com o desemprego de cerca de 15 milhões de brasileiros e com a fome de 19 milhões de pessoas, todos também conhecidos oportunamente como sua excelência o eleitor. São tempos estranhos. Tão estranhos que me obrigam a dar crédito a uma recente análise do controverso, polêmico e irritadiço ex-prefeito, ex-governador e ex-senador Roberto Requião. Sem mandato, mas com configurações historicamente à esquerda, ele já brigou até com ele mesmo, mas sempre teve posições muito claras sobre tudo, inclusive a respeito da atuação especulativa das instituições financeiras, que emprestam caro o dinheiro pelo qual pagam muito pouco.

Semana passada, me rendi a mais uma das estridentes reações de Requião ao emburrecimento político da população. O ex-senador lembrou que, em 2019, os bancos tomaram 70 mil imóveis por inadimplência. Entretanto, o pobre vinculado à direita continua achando que o comunismo é que vai tomar seus bens. Portanto, antes de votar, melhor pensarmos um pouco para não comprarmos gato por lebre ou nos obrigarmos a conviver quatro anos com verdades que sabidamente são mentiras. Embora estranhos, os tempos têm de ser outros. Mais do que eleitores, temos de ser cidadãos, precisamos pensar no país e não apenas em nosso nariz. Não devemos esquecer jamais que o sonho de hoje pode ser o pesadelo de amanhã. Não vale a pena repetir.

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