Antes da pá de cal derramada pelo Tribunal Superior Eleitoral, o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou vincular Lula ao PCC. Para isso, lembrou uma visita que Luiz Inácio fez ano passado ao Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Agora, a crítica é sobre a reunião com o Foro de São Paulo, grupo que reúne partidos, governos e organizações da esquerda da América Latina. O encontro ocorrerá entre 29 de junho e 2 de julho, em Brasília. Com a memória enfraquecida, Jair Messias esqueceu com a rapidez de um raio os encontros com Donald Trump e Katalin Novák, presidente da Hungria, respectivamente papa e cardeal da extrema-direita mundial. Também não lembra da reunião, no Palácio da Alvorada, com uma leva de embaixadores, aos quais, sem prova alguma, colocou em xeque a segurança do sistema eleitoral e apontou risco de fraude no pleito
Ele esqueceu, mas o povo e o TSE não. Quando o goleiro de um time de futebol que disputa títulos e a ponta do campeonato é a estrela de um jogo, é sinal de que algo está errado. O mesmo ocorre na política. Quando a cadeira principal do governo de uma República séria deixa de ser ocupada pelo presidente e passa ao comando do Poder Judiciário ou do Congresso Nacional, tenha certeza de que alguma coisa está fora da ordem. E esteve em pelo menos sete dos últimos mandatários da Nova República, aquela que surgiu após 25 anos de ditadura militar. Destes, dois estiveram presos, um está em vias de (o mesmo que sofreu impeachment), uma foi “empichada” e o último deve seguir o mesmo caminho do sol quadrado, depois do inevitável estrangulamento da inelegibilidade.
Dois dos presos, um foi liberado pelo Supremo Tribunal Federal, está governando e, a olho nu, tentando se livrar das amarras e das algemas da Câmara dos Deputados, sob o comando do Capitão do Mato Arthur Lira, do PP das Alagoas. Pode ser que consiga, pode ser que não, devido a bocarra financeira do Centrão do mateiro e matreiro Lira das Candongas. Para conseguir, terá de fazer concessões às custas do dinheiro público. É triste a confirmação de que a maioria de nossos políticos se elege para auferir lucros pessoais. O povo que se dane. Se possível, que se exploda (proibido pelo projeto da censura, o termo que pensei usar tem o mesmo sufixo). Melhor ser politicamente correto.
Tomara que o dindin público que o atual presidente terá de usar para governar acabe realmente nos bolsos da turma que tem por hábito emparedar governos. São aqueles que sabidamente oferecem todas as dificuldades do mundo para, em troca, receber as facilidades disponíveis no governo fraco de um país forte. Não fosse crime a ação desses maus políticos, endossava a provável e pronta atenção de nosso mandatário, pois somente desse modo passaria para o outro lado (aquele liderado por um mito terrivelmente honesto) a pecha de ladrão utilizada para esculhambar Luiz Inácio durante a última campanha presidencial.
Lula fez e certamente fará concessões. Lula foi recolhido e liberado, embora não tenha sido inocentado. De qualquer maneira, é um democrata, um ícone político, um presidente eleito três vezes por maioria absoluta de votos e como tal deve ser respeitado. Se ainda não fez tudo que prometeu ou que o povo esperava dele, pelo menos tirou o país da condição de pária do mundo e ao menos recolocou nos trilhos do respeito internacional. O Brasil hoje tem voz ativa em qualquer mesa de reunião, inclusive as do G7 e do G20. O anterior se limitava às mesas do falecido Olavo de Carvalho, à dos articuladores do golpe, e às do 01, 02, 03 e, às vezes, à do 04, quando este não tinha compromissos extras.
Sem referências a deputados e senadores – talvez um livro de mil páginas para enumerá-los –, diria que o antecessor de Lula da Silva foi quem mais frequentou as páginas policiais em apenas quatro anos de mandato. O volume de advogados não foi suficiente para esfriar o banco dos réus. Alvo de 16 ações no Tribunal Superior Eleitoral, de cinco inquéritos no Supremo Tribunal e de mais um em curso na Polícia Federal, sua ex-celência (?) é investigado por envolvimento em milícias digitais, divulgação de notícias falsas e inclusão de dados falsos contra a Covid-19 nos sistemas do Ministério das Saúde, ataques às urnas eletrônicas, suposta interferência na Polícia Federal e autoria intelectual dos atos de 8 de janeiro. Querem mais? Aguardem o pós-inelegibilidade.
Impossível para a minha geração, para as que sucederam a minha e para a atual, não parecer de todo improvável para as próximas gerações desdizer o ex-presidente francês Charles De Gaulle e afirmar a plenos pulmões que habita um país sério. Que a sorte nos acompanhe até lá. E que essa mesma sorte proteja os que são bons. Pelo menos os que estão se mostrando bons. Se não mudar, o povo prazerosamente faz questão de arcar com todos os custos da próxima excursão turística ao Titanic. A disputa é para saber quem é o piloto da nave suicida. Embora a fila seja grande, eu, Xandão, nove ministros do STF, quatro ou cinco do TSE e 60,3 milhões de eleitores já escolhemos o piloto. Façam suas apostas.