O cenário da violência no Brasil tem mudado ao longo dos anos. Mas não só isso. Mudou também a forma de se olhar para essa violência.
Se por um lado o país bate recordes em números de homicídios, agressões, roubos e furtos – que hoje saíram dos grandes centros e chegaram a localidades antes tidas como pacatas -, por outro lado esses assuntos hoje são tratados de forma mais aberta, na busca pela solução.
Nos dias atuais, temas como agressão às mulheres, bullying com crianças e adolescentes e o aumento dos índices de violência na população cada vez mais jovem são menos tolerados e já são abordados abertamente pela sociedade, que procura meios de resolvê-los.
Quando cheguei ao Brasil, na década de 1990, para difundir o krav magá – a defesa pessoal israelense – me deparei pela primeira vez com a imagem do medo.
Encontrei uma população amedrontada, que andava nas ruas sem joias ou roupas que representassem riqueza. Que carregava seus sapatos finos ou tênis de grife em sacolas de supermercado para serem utilizados apenas no local de trabalho ou em algum evento social.
Adolescentes não andavam sozinhos nas ruas, mesmo durante o dia, e se locomoviam levados por seus responsáveis de carro. Encontrei as entradas dos prédios cercadas de grades e portões trancados. As pessoas viviam acuadas e se abstinham de seu poder aquisitivo por conta de um atuar passivo.
Eu, que sou nascido em Israel, um país cercado por inimigos e onde batalhas e ataques terroristas fazem parte do cotidiano, e que passei por quatro guerras ao longo de minha vida, só vim conhecer o medo no Brasil, uma situação estranha para mim.
Isso porque, desde criança, aprendi que a única chance de ganhar de uma situação de violência é enfrentando-a.
Por toda a minha vivência, acredito que a população pode ser parte atuante no combate à violência enfrentando essas situações com autoconfiança.
Quando se fala em defesa pessoal, se fala em direito à vida. O krav magá foi desenvolvido na década de 1940, por Imi Lichtenfeld, para permitir a qualquer pessoa, independente de força física, idade ou sexo, poder voltar em segurança para casa.
Do ponto de vista físico, o princípio desta modalidade de defesa é que a prática seja exequível por qualquer pessoa, em seu ritmo próprio e respeitando o limite de seu corpo. Ainda assim há o estímulo para que os praticantes se exercitem diariamente para melhorar a agilidade, condicionamento e força.
As grandes transformações, no entanto, são emocionais. O krav magá forma pessoas mais seguras. Para enfrentar situações de risco é preciso capacidade mental, e isso se adquire por meio de práticas orientadas pelo instrutor.
A prática também influencia no comportamento. Atenção, disciplina, seriedade, saber diferenciar o certo do errado, usar o autocontrole. Tudo isso é praticado.
O resultado extrapola os treinamentos e se reflete na qualidade de vida das pessoas. Por meio dos treinos, o praticante aprende a superar obstáculos físicos e mentais e se torna uma pessoa melhor em todos os sentidos: ganha coragem e confiança em si mesmo, equilíbrio emocional e muda a postura diante da vida.
E as pessoas adquirem confiança quando descobrem que, mesmo quando não têm a mesma força física do seu oponente, são capazes de se defender de forma simples, com movimentos rápidos e eficientes.
Mais do que isso, o krav magá trabalha a defesa pessoal na raiz da palavra, ou seja, às vezes, a defesa está em não se colocar em situação de risco, em não agir impulsivamente e a reagir conforme o ataque.
Eu comecei a praticar o krav magá aos três anos, com o criador desta arte, e fui o primeiro faixa-preta a sair do Estado de Israel para divulgar a modalidade.
Em 2015, completaremos 25 anos de krav magá no Brasil e comemoramos com orgulho a evolução desse trabalho, na formação de militares que atuam na defesa assim como no treinamento e capacitação de civis, que hoje são agentes atuantes no combate à violência no país. E também na Argentina e no Peru, onde estamos presentes por meio da federação sulamericana.
A questão da segurança envolve as esferas governamentais, mas também o setor privado e a população como um todo.
A formação de nosso jovens para serem pessoas de bem e a de nossa sociedade para estar atenta aos riscos, segura para denunciar às agressões e preparada para reagir conforme o ataque é o que vai fazer com que tenhamos um ambiente mais seguro e saudável para vivermos.
Kobi Lichtenstein