A desinformação disseminada pela internet é a “praga do século 21”, disse nesta quinta-feira (14) o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, na abertura do seminário Combate à Desinformação e Defesa da Democracia. Para ele, além de ter colocado em risco a democracia brasileira, a desinformação tem causado efeitos perversos na sociedade, como o aumento exponencial do número de suicídios entre adolescentes.
“Aproveito o gancho do julgamento [dos primeiros réus pelos atos golpistas do 8 de janeiro], que tem toda a relação com a questão da desinformação”, disse Moraes. “Tudo foi organizado a partir das redes, com uma série de mensagens fraudulentas e mentirosas, que se iniciaram lá atrás, em relação a inexistentes e absurdas alegações de fraudes nas urnas. Nós vivemos, aqui no Brasil, talvez o que nenhum outro país viveu. Sentimos na pele a questão da desinformação”, acrescentou.
Segundo o ministro, esse contexto gerou, no Judiciário, a necessidade de se adaptar aos novos tempos. “Ainda estamos muito longe do ideal, mas soubemos fazer com que o Judiciário começasse a aprender não só a entender a importância de se combater a desinformação, como também estabelecer mecanismos importantes para salvaguardar a democracia”, disse ele, acrescentando que a desinformação gera perigos não apenas à democracia.
“Notícias fraudulentas disseminadas nas redes sociais aumentaram exponencialmente o número de suicídios em adolescentes. Isso é uma praga. É a praga do século 21”, argumentou.
Moraes defendeu que, para combater essa “praga”, é necessário instrumentalizar todos os meios de controle e a Justiça. Algo que pode avançar a partir dos debates que serão conduzidos durante o seminário – em especial em três frentes: educação, prevenção e, em último lugar, repressão.
“Esse é o grande desafio, hoje, deste seminário. Temos de atuar em três frentes. A primeira é a educação, para as pessoas entenderem. Principalmente adolescentes e pessoas jovens, de um lado, e, do outro lado, as pessoas mais idosas, que abandonaram os telejornais”.
“No caso das pessoas mais jovens, elas nem se encontraram com a mídia tradicional. Não acompanham jornais. Não falo nem de jornal físico, que já é pré-história. Eles não acompanham sequer os jornais de internet. Se somarmos os cinco telejornais com maior audiência, eles perdem [em termos de audiência] para o primeiro influencer”, afirmou o ministro.
Sobre a prevenção, ele lembrou que é necessária uma alteração dos mecanismos de autorregulação e também a regulamentação. “O Congresso Nacional está discutindo isso, mas ainda está devendo uma regulamentação. É necessária uma regulamentação porque as big techs [gigantes de tecnologia, como Google, Apple, Microsoft e Meta] não podem continuar imunes à responsabilidade pela desinformação em cadeia que propagam, atacando a democracia”.
“Obviamente, se a educação não deu certo e a prevenção falhou, o terceiro ponto é a repressão. Mas uma repressão mais moderna, diferente dos métodos antigos. Avançamos muito na Justiça Eleitoral, por exemplo, alterando a retirada de desinformação nas redes, que tradicionalmente demorava 24 ou 48 horas, o que é uma vida. Passamos esse prazo para duas horas; depois para uma hora [na véspera das eleições]. E, no dia das eleições, 15 minutos. Ou seja, faz um dano muito menor”, complementou.
Segundo o ministro, nos painéis programados para o encontro será possível discutir essas três frentes – educação, prevenção e repressão –, bem como “avançar para tornar a democracia um pouco mais imune a essa enxurrada de notícias fraudulentas e ataques virtuais”.
O seminário Combate à Desinformação e Defesa da Democracia é promovido pelo STF em parceria com universidades públicas. O evento, organizado no âmbito do Programa de Combate à Desinformação, segue até sexta (15) reunindo ministros, academia e representantes da sociedade civil.
Organizado com a participação também da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e do Colégio de Gestores de Comunicação das Universidades Federais (Cogecom), ele terá sete painéis que abordarão temas como regulação das plataformas digitais, a educação midiática e o papel das agências de checagem na defesa da democracia.
Segundo a presidente do STF, ministra Rosa Weber, o simples enunciar dos aspectos que serão abordados já mostra a relevância do debate. “A informação é instrumento poderoso que pode destruir vidas e instituições. Seu lado mais sombrio mostrou a face nos ataques covardes do 8 de janeiro, data à qual sempre me refiro como dia da infâmia”.
De acordo com a ministra, construções de narrativas fantasiosas foram feitas com o objetivo de desacreditar instituições. “Foram as sementes do mal que transformaram aquele dia em uma das páginas mais tristes e lamentáveis da história do país, quando pela primeira vez esta suprema corte foi invadida e vandalizada nos quase 200 anos de sua existência”.
‘Desejo que os debates que terão lugar neste seminário possam gerar frutos e trazer resultados concretos na luta contra a desinformação”, afirmou.
Segundo os organizadores, a ideia é debater formas de enfrentar a desinformação e o discurso de ódio. Também está previsto o lançamento do livro Desinformação – O mal do século (Distorções, inverdades e fake news: a democracia ameaçada), fruto de parceria entre o STF e a Universidade de Brasília (UnB).