Sem história
Presidente “ripa” quem não conhece e deve acabar “ripado”
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emExpressão de origem bíblica, quem semeia vento colhe tempestade quer dizer exatamente que se você planta algo ruim, a tendência é que colha algo ainda pior. Do mesmo modo, quem espalha injustiça fatalmente colherá a desgraça. É a lei de causa e efeito. Furioso com o pessoal do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o presidente da República demitiu todo o comando da entidade após tomar conhecimento da interdição por alguns dias de parte de uma obra absurda do empresário Luciano Hang, o queridinho da Havan, em um terrenos com achados arqueológicos na cidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul.
No local foram encontrados cerâmicas pré-coloniais de dois tipos diferentes – uma delas de indígenas tupi guaranis – e pedaços de louças fabricadas no fim do século 19. Utilizando seu voraz conhecimento histórico e sua conhecida verborragia de troglodita, o presidente “ripou” o pessoal do Iphan sob o argumento de terem impedido uma obra empresarial por causa de dois pedacinhos de azulejos. O moço do terninho verde peçonha não informou, mas seu empreendimento não sofreria solução de continuidade, na medida em que os arqueólogos queriam apenas acompanhar os trabalhos para recolher o que fossem encontrando de importante para futuras pesquisas.
Era só isso, mas Luciano Hang, do alto de seu “atrasômetro” cultural, queixou-se ao mito e foi atendido. Além da demissão, ou “ripagem” no jargão presidencial, houve verdadeiro linchamento virtual dos pesquisadores. Voltando ao ditado da abertura da narrativa, quem com ferro fere com ferro um dia será ferido. O fato repercutiu e chegou ao Supremo Tribunal Federal, que avalia uma notícia-crime apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), acusando o chefe do Executivo federal de crimes de prevaricação e advocacia administrativa. Considerando que a relatoria da ação caberá ao novo membro do STF, ministro André Mendonça, o terrivelmente evangélico, provavelmente a ação será encaminhada ao gavetário do tribunal.
De qualquer maneira, o Brasil inteiro ficou sabendo que o presidente da República sequer conhece os institutos para os quais indica ou empossa apadrinhados seus ou de amiguinhos das turmas do Centrão ou do cercadinho. Associado a um amontoado de chiliques, um simples pedaço de azulejo pode custar caro ao mito de barro. Com sua caneta Bic, Jair Messias Bolsonaro “ripou” quem o desagradou e incomodou Luciano Hang. O troco pode chegar em outubro de 2022, também conhecido como ano eleitoral, quando o mito deve ser “ripado” pelo eleitor.
A síntese dessa chuvarada de desmandos é simples. O presidente da República Federativa do Brasil não tem história e chances reais de sequer figurar nos livros de história contemporânea. Em verdade, Bolsonaro não está nem aí para a história brasileira. Como não está nem aí para a educação, cultura, saúde, segurança. Na verdade, não está nem aí para o país ou para o povo. O país pegando fogo, a Bahia transbordando, os grandes centros mergulhados na miséria e sua excelência nadando de braçada como se o mundo não existisse. E para ele e família não existe mesmo.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978