Lá pelos lados da grande região da saída Norte de Brasília, justamente onde existe um pequeno sobrado, plantou-se uma semente do mal que, ao brotar, desceu a serra e espalhou raízes no Palácio do Buriti, em suas autarquias e em empresas públicas. Cavou-se, então, um poço profundo, onde a escuridão aterrorizante de um conto de Stephen King deu lugar ao brilho intenso de pérolas interplanetárias imaginadas por Isaac Azimov. Os cultivadores desse pequeno grão são conhecidos como Buripetistas. Eles servem (e se servem) do Governo do Distrito Federal independente da cor partidária ou ideologia de quem esteja sentado na cadeira mais alta do gabinete de onde se vislumbra uma formosa loba cujas tetas são sugadas diuturnamente, faça chuva, faça sol. A gastança impera. Vai de superfaturamento do erário a lavagem de dinheiro. E o Tribunal de Contas, coladinho ao edifício que abriga um chefe a cada quadriênio, como não faz justiça, mantém os olhos permanentemente vedados, como se Thamis fosse.
Essa semente, que fixou tentáculos no próprio Palácio do Buriti, na Corte de Contas, na Codeplan, na Terracap, na Novacap, no BRB e agora também no SLU, estava prestes a ser extirpada e matada com poderoso agrotóxico. O único antídoto para acabar com essa sujeira seriam as forças auxiliares de segurança, a exemplo das polícias Militar, Civil e até o Detran. O veneno amargo veio com a intervenção na Secretaria de Segurança Pública. O pretexto inicial visava apenas o pequeno universo entre o QG do Exército, no Eixo Monumental, e a praça dos Três Poderes. O interventor indicaria seu substituto, numa composição entre o ministro Flávio Dino e a governadora em exercício Celina Leão. Mas, como paredes têm ouvidos, a turma daquele pequeno sobrado entrou em ação.
Como a segurança pública é o cerne da questão, surgiram diferentes nomes para ocupar a cadeira de Ricardo Cappelli no dia 1º de fevereiro, exatas 24 horas após o término da intervenção federal. Um desses nomes especulados por meios de comunicação, é o do delegado da Polícia Federal Cláudio Tusco. O próprio comando da PF avalizou a suposta indicação, por entender que se trata de profissional profundo conhecedor de Brasília, com larga experiência em segurança pública e relação altamente republicana com outros agentes públicos. A favor dele também conta o fato de ter trabalhado no GDF, dentro do seu campo de atuação, à época do governo do petista Agnelo Queiroz. De lá para cá, os relatos são de que Tusco trouxe ainda mais brilho à sua longa ficha de prestação de serviços para a sociedade civil organizada.
Em meio ao arcabouço que se formou em torno do próximo secretário de Segurança Pública, Notibras colocou sua equipe em campo, localizou o delegado Cláudio Tusco, mas ele, avesso a aparecer, resumiu em uma frase o que nossos repórteres pretendiam transformar em entrevista. “Sou delegado da Polícia Federal, fui consultado sobre uma nova missão, mas não sou secretário. Perdoem-me, mas não vou especular sobre o que não é concreto”.
A sinceridade de Tusco aguçou o faro investigativo dos nossos repórteres. A frase do delegado não ofuscou o objetivo de irmos em busca do que há por trás dessa batalha supostamente fraticida pelo comando da segurança pública na capital da República. Pelo que se apurou até aqui, ficou claro que há um jogo de cabo de guerra. E a meta dos Buripetistas, é reempossar o ex-secretário Júlio Danilo. Era ele o chefe da área de segurança no fatídico dia da diplomação de Lula, quando veio o primeiro sinal de que havia um golpe em gestação. A data, 12 de dezembro. O caos tomou conta da cidade. Houve ataque e tentativa de invasão da sede da Polícia Federal (casa de origem de Júlio), ônibus foram incendiados, postos vandalizados, delegacia da Polícia Civil destruída, trânsito obstruído, veículos de civis queimados e revirados, baderna na porta em que se hospedara o ainda presidente eleito… E, pior: Júlio estava em Brasília e ninguém foi preso. Enfim, um cenário para inspirar Stephen King.
Na avaliação de Notibras, o bando do pequeno sobrado tem suas digitais em muita coisa que anda acontecendo em Brasília nos últimos 30 dias. A única certeza é a de que os Buripetistas não desceram a serra para espalhar o terror na cidade no dia 8. Mas nossa equipe descobriu que, por não ter sido contemplado com uma vaga na Esplanada dos Ministérios, o grupo lá do alto da serra, conhecido por seu fisiologismo, decidiu concentrar seus esforços para ampliar os tentáculos no Governo do Distrito Federal e colocar os pés e as mãos na Secretaria de Segurança Pública. O primeiro gesto foi produzir fake news contra Cláudio Tusco. O segundo, e mais grave, foi sussurrar entre ouvidos, uma história de horrorizar Candinha: Flávio Dino é uma pessoa facilmente manipulável e o interventor Ricardo Cappelli já teria sido seduzido por uma mistura de desconhecimento das peculiaridades da SSP com a simpatia vinda dos que o receberam no cargo interino com um carismático coletinho.
Apostando na fraqueza (esses Buripetistas decididamente são mal informados) e na inacreditável insensibilidade do interventor, essa corrente petista, que age como professores da turma do Araguaia e Xambioá, lá do Bico do Papagaio, colocou no colo de Cappelli seus indicados. A visão que se tem é a de que Dino, o Manso, e Cappelli, o Cego, não passaram um pente fino na fichas dos delegados Maurílio, do Detran; Milton Neves, de volta à Secretaria Executiva da SSP, cargo que ocupou na gestão de Anderson Torres; George Couto, nomeado subsecretário de Inteligência; e o coronel aviador Heitor Antunes, reempossado na Subsecretaria de Ensino e Gestão de Pessoas.
Enquanto Dino, o Manso. e Cappelli, o Cego, dão as costas para o que se passa em seu entorno, Brasília assiste a uma campanha cada vez mais crescente de destruição de reputações, ferramenta que os bolsonaristas dominam. Foi assim que surgiram factoides e notícias que, ao contrário da mula-sem-cabeça, têm manchete, mas não têm conteúdo: um real de doação seria a prova da relação direta com o clã golpista; desenterram uma apuração administrativa que foi encerrada sem denúncia ou acusação, nos idos de 2008; e, por último, uma briga de condomínio que teria descambado em delegacia.
Nesse último episódio, o que a máquina de métodos bolsonaristas abraçada pelos Buripetistas menciona, é que um delegado de Polícia Civil teria investigado Claudio Tusco. O que não se conta é que, atualmente, esse mesmo delegado encontra-se sob risco de ser expulso da corporação por prática de perseguições e tortura de um pai de família na frente de seus dois filhos menores de idade. Como o caso está em segredo de justiça, mantém-se, assim, o nome dele no anonimato. Mas nossa equipe descobriu, como se instigasse o Minotauro, que no curso dessa mesma investigação fantasiosa e melindrosa, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios arquivaram as acusações contra Cláudio Tusco, indicando-lhe, assim, a saída do labirinto. Ou seja, o delegado federal que declinou dar entrevista a Notibras pelas razões acima citadas, não chegou sequer a ser suspeito de qualquer crime. Já contra o delegado sobre quem corre processo em segredo de justiça, as investigações sugerem vínculos fortes com os bolsonaristas.
Sem entrar no mérito das especulações, Notibras assume a responsabilidade de tornar público que os Buripetistas, ao perderem espaço no Governo Federal, pretendem deixar o ovo da serpente guardado no âmago do GDF, numa aliança branca com o próprio Palácio do Buriti. Basta recordar que coube a Anderson Torres designar Júlio Danilo para a missão de ser seu terra-tenente enquanto dançava com Bolsonaro, e renomeou Robson Cândido para a Chefia da Polícia Civil, onde o delegado senta em processos que apuram supostas torturas e perseguições, que seguem aguardando um desfecho ou a prescrição na Corregedoria da própria polícia por ele comandada.
A equipe de Notibras está em busca dos manuscritos dos próximos capítulos dessa história. Se, por um lado, o staff golpista ainda luta para recuperar a cadeira tomada de Anderson Torres, cujos galhos foram arrancados por ordem de Alexandre de Moraes com informações atribuídas a Júlio Danilo, e em manter um clima de “nós e eles” dentro do Distrito Federal, por outro lado, a falta de clareza, por parte do Governo Federal, deixa espaço para que aventureiros sonhem em ocupar o espaço e para golpistas exercitarem seus métodos de persuasão. O que não se pode – essa a conclusão temporária – é deixar de estar vigilante, pois sopapos trocados entre Buripetistas e lulistas-raiz no Lago Norte, podem acabar em tragédia. Aí sim, Stephen King e Isaac Azimov seriam obrigados a pedir a ajuda de Agatha Christie e Arthur Conan Doyle, numa tentativa para elucidar tudo de uma vez por todas e colocar ordem na casa.