Para a pergunta “qual é a cara do Brasil?”, podem surgir desde respostas sociológicas até as mais irônicas. Pois é pelo segundo caminho que segue MPB – Musical Popular Brasileiro, que estreia dia 2 de março no Teatro das Artes, no Shopping Eldorado Logo em sua abertura, um pot-pourri de canções que buscam respostas para aquele questionamento dá o tom do espetáculo – com Alô, Alô, Brasil (Eduardo Dussek), Isto Aqui o que É (Ary Barroso), Brasil (Cazuza) e Que País é Esse? (Renato Russo), o espectador descobre que a visão crítica sempre será temperada pelo bom humor a partir da fala de um dos personagens, que responde devolvendo a pergunta para plateia: “Seria uma terra de praias, mulheres e coqueiros? Ou um lugar de maracutaias, intempéries e trambiqueiros?”.
Escrito por Enéas Carlos Pereira e Edu Salemi, o musical segue a estrutura clássica do teatro de revista, gênero muito popular nos séculos passados por usar a paródia para comentar os fatos da atualidade. “A metalinguagem enriquece o texto”, acredita Pereira. “No MPB, trabalhamos com elementos de uma linguagem teatral popular – o humor e o teatro de revista -, e para tanto, no recurso de um espetáculo dentro do próprio espetáculo nos auxilia a rirmos de nós mesmos.”
De fato, a trama acompanha as agruras da filial brasileira de uma multinacional, que recebe a visita de investidores estrangeiros. Para impressioná-los, a empresa prepara um grande espetáculo com canções da MPB, dirigido por um antigo diretor de musicais. Às vésperas da estreia, porém, o encenador o diretor sofre um colapso e vai parar às portas do Céu, entre a vida e a morte. Lá, encontra dois anjos caídos, fugidos do inferno, que lhe garantem o retorno à Terra. Em troca, o diretor terá de montar – em tempo recorde – um espetáculo musical com estrelas da MPB já falecidas.”
“Aparece aí uma das nossas brincadeiras, que é ironizar a onda de musicais biográficos sobre artistas já mortos que ainda marca os palcos brasileiros”, diverte-se Jarbas Homem de Mello, ator já consagrado no gênero e que estende aqui sua carreira como diretor. “Ambientamos a trama em um barracão de escola de samba, que prepara seu desfile. É o ambiente ideal para se criar uma história atemporal e onde não há nenhuma preocupação com a verossimilhança.”
Assim, com liberdade para aventuras, Jarbas conta que o texto foi modificado à medida em que corriam os ensaios, um trabalho conjunto que uniu tanto o elenco como a equipe criativa, formada também pelo diretor musical Miguel Briamonte e a coreógrafa Kátia Barros. “Escolhemos as canções de acordo com a necessidade da dramaturgia”, conta Briamonte, que teve o cuidadoso e difícil trabalho de acomodar os arranjos de várias músicas no tempo de apenas uma. Experiente, ele chegou ao requinte de construir uma única faixa unindo trechos de 18 canções (a grande maioria de Chico Buarque) para uma cena romântica.
“Os arranjos conversam com os movimentos”, observa Kátia Barros, que trouxe elementos de brasilidade para a encenação. “Busquei quebrar a linguagem do musical, criando uma coreografia que não se apoia na tradicional da Broadway.”
As novidades foram um desafio para o elenco, encabeçado por Adriana Lessa, que substituiu Danielle Winits, presa à rodagem de um filme. “Trabalhei em um espetáculo de revista dirigido por Abelardo Figueiredo e sei como esse tipo de teatro chega bem ao público”, diz ela, que vive Suzete Campos, grande atriz de musicais que será dirigida pelos veteranos Nogueira (Dagoberto Feliz) e (Dino) Marcelo Góes. Ele, porém, terão de enfrentar as ideias modernas da assistente Clara (Giulia Nadruz). “Ela acrescenta celulares à cena”, diverte-se a atriz. Todos sob a proteção dos anjos Jura (Érico Brás) e Gero (Reiner Tenente), dupla atrapalhada que remonta a Oscarito e Grande Otelo. “Um elenco com protagonistas negros, motivo de orgulho”, observa Brás.