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Meu neto chegou

Quando a dor do parto faz uma fortaleza tremer de alegria

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Autor/Imagem:
Tania Moschini - Foto P4odução Irene Araújo

Casei-me cedo e fui presenteada pela vida com três filhas e seis netos. Em nenhum dos três nascimentos senti as dores de um parto normal. O primeiro por impossibilidade física, os outros dois por escolha. E assim encerrei minha vida útil como “parideira”.

Chegou a hora das filhas parirem. Das três, somente a caçula – que me daria o quarto neto – teve parto normal humanizado. E eu, claro, como a mãe companheira e solidária que sempre tentei ser, fiz questão de registrar que estaria presente desde o início dos sinais. Então, conforme o combinado, minha filha acionou-me assim que o “alarme” tocou. E lá fui eu, uma fortaleza ambulante, o exemplo da ponderação e do equilíbrio para todos os membros da família.

Ocorre que o processo todo foi muito demorado – pelo menos na minha concepção -, quase doze horas de trabalho de parto. As dores, que começaram acanhadas, foram, aos poucos, aumentando, até tomarem proporções que, para uma leiga como eu, já estavam saindo do controle. Bem, pelo menos era isso que parecia. E eu lá, junto, firme.

O tempo foi passando, já estávamos com várias horas de trabalho de parto. Eu tentava disfarçar, mas me sentia cada vez mais assustada. Minha filha, com toda a assistência profissional necessária, inclusive com uma doula – cujo trabalho admirável eu nem conhecia -, mantinha-se corajosamente determinada e tranquila, apesar das dores que iam e vinham, cada vez com mais frequência.

Então, a médica deu a boa notícia: chegou a fase expulsiva. Nunca tinha ouvido aquilo, mas dei à expressão o significado puro, que o momento, por si só, traduzia: meu neto, finalmente, estava sendo expulso. Ufa! O sufoco estava chegando ao fim!

Ledo engano! O que, na minha ingenuidade, estava na fase conclusiva, demorou mais uma eternidade. A cada contração, uma força hercúlea, e a cabecinha dava o ar da graça. E voltava.

De novo, mais uma contração, mais um esforço descomunal, a cabecinha “coroando” (outra expressão nova), e nada.

E assim o tempo foi passando, meus olhos cada vez mais assustados, meu coração saindo pela boca. Minha filha lá, sofrendo, e eu impotente. Mas me segurei. Afinal, que mãe eu seria, depois de três filhas e três netos, se não conseguisse conter minhas emoções naquele momento? Se ela, mãe de primeira viagem, estava controlada, por que eu não estaria? Não me sobrava escolha, a não ser respirar fundo, e continuar lá, firme, forte.

Ela estava cercada de gente (seu marido atrás, apoiando-a carinhosamente) e minha mente sabia, pelo semblante de todos, que tudo transcorria normalmente. Mas meu coração não. Não sei quantas idas e vindas o danadinho do Miguel aprontou. Chegava até a porta e desistia. Parecia que brincava de esconde-esconde. Parecia que zombava de nós.

Então, finalmente, aquele serzinho escapuliu da minha filha. Pronto! Já estava entre nós. Foi rapidamente acolhido pela mãe que, ao tê-lo nos braços, desmoronou de emoção. Meu Deus! Acho que nunca, nunca senti algo tão forte.

Passado o primeiro momento, em que fiquei hipnotizada pela cena do encontro dos dois, saí correndo da sala. Já não aguentava mais. Então, a fortaleza desabou, feito um castelo de areia inundado pela maré. E o choro de felicidade explodiu.

Obrigada, filhinha, por ter me proporcionado tamanha emoção! Nunca, nunca vou me esquecer.

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