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‘Que Deus perdoe Olavo de Carvalho de todas as maldades’

Morreu Olavo de Carvalho, o guru do governo do capitão, o ícone dos conservadores, o autointitulado filósofo da turma do cercadinho, o ensaísta de padaria. Morreu o “farol dos brasileiros”, conforme definição do próprio presidente da República. Lamento informar, mas nem como lamparina eu o conhecia. Talvez um palito de fósforo apagado. Enfim, morreu um dos principais disseminadores da tese de que o vírus da Covid-19 é uma invenção comunista contra os sérios, íntegros, honestos e probos, como ele. A causa da morte não é conhecida oficialmente, mas ele mesmo havia anunciado ter se infectado com o novo coronavírus no dia 16. Ou seja, morreu do que combateu. Com o devido perdão divino, o “exemplo de brasileiro” foi se juntar no reino dos céus ao amontoado de negacionistas furiosos por terem acreditado em tanta mentira.

Sem delongas, Olavo de Carvalho era tão importante para o Brasil que vivia e morreu nos Estados Unidos. Sua “gigante luta pela liberdade” ficou nacionalmente marcada pela defesa intransigente do golpismo. Em outras palavras, como disse mais cedo o jornalista Reinaldo Azevedo, foi-se mais um caricaturista de si mesmo. Os negacionistas raiz estão órfãos. Em sua homenagem, prometem seguir os “ensinamentos” do líder das palavras falsas até o fim dos tempos. Tomara que seja somente até os estertores do governo que defendem. Aliás, pena que tenha partido antes de assistir a derrocada do discípulo mais famoso que já ajudou a forjar. Lamentável é saber que ele deixa pupilos por toda parte.

Para ilustrar exemplos de suas estultices e das bizarrices governamentais contra a imunização do cidadão brasileiro, recentemente o Tribunal de Justiça do Distrito Federal negou um pedido inusitado e descabido de prisão do jornalista William Bonner, que havia postado uma foto fazendo um teste de PCR para Covid. Um advogado local, cujo nome é irrelevante, entrou com o mandado de segurança cível contra Bonner porque, na sua avaliação, o apresentador do Jornal Nacional, da TV Globo, incentiva a vacinação contra o vírus da morte. No pedido, o tal advogado alegou que o jornalista comete os crimes de indução de pessoas ao suicídio, de causar epidemia e de envenenar água potável, substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo.

Lembro que Bonner fez apenas declarações sobre os impactos positivos da imunização no combate à pandemia. É ou não é sem noção um sujeito desses? Na prática, é o resultado do delirium tremens que infectou 11 entre dez seguidores do bolsonarismo. No caso envolvendo Willian Bonner, é claro que o Poder Judiciário não iria afagar teorias conspiratórias ou devaneios apalermados de qualquer cidadão de pouca ou nenhuma inteligência. O problema é que ele não está sozinho nas atrocidades mentais. Devo acreditar que ausência de inteligência não é o problema da deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP).

Todavia, como entender como algo normal ela, embora defensora das posições de Jair Bolsonaro, requerer ao Ministério da Saúde, à Anvisa e ao Ministério Público federal a suspensão da vacinação contra a Covid-19 em crianças de 5 a 11 anos? São pessoas que impressionam pelo cinismo, pela desfaçatez. No pedido, ela exigiu das autoridades uma “reavaliação da segurança” da vacina produzida pela Pfizer. Vale lembrar que a deputada fez questão de esquecer que, além dos técnicos da Anvisa, o imunizante recebeu aval do médico Marcelo Queiroga, ministro da Saúde e supostamente entendido na matéria. Em resumo, ou somos todos loucos desvairados ou precisamos rever as teses contrárias às assombrações. Olavo de Carvalho que o diga.

No auge da pandemia, ele postou no Twitter que “o medo de um suposto vírus mortífero não passa de historinha de terror para acovardar a população e fazê-la aceitar a escravidão como um presente de Papai Noel”. Supostamente abandonado pela cria, talvez receba o carinho eterno de Donald Trump, o maluquete gerador das doideiras brasileiras. O fato é que negou o mal que deve ter lhe causado a morte. Por isso, há uma fila indiana no céu com 624 mil brasileiros aguardando do filósofo do além explicações menos fantasmagóricas ou uma lorota plausível capaz de negar que negacionismo e desinformação matam. O farol apagado dos brasileiros se foi e, conforme sua legítima filha, Heloísa de Carvalho, que Deus o perdoe por todas as maldades.

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