O ano de 2018 foi tão surpreendente que reflexões sobre o período já começam a surgir. É o caso de 2018: Crônicas de um Ano Atípico (Kapulana), de Martinho da Vila, e Sobre Lutas e Lágrimas (Record), de Mário Magalhães. Em ambos, há fatos comuns porque extraordinários, como o assassinato da vereadora Marielle Franco, a prisão do ex-presidente Lula, a derrota do Brasil na Copa da Rússia e a campanha que elegeu Jair Bolsonaro presidente.
Martinho da Vila teve ainda outro motivo, mais feliz: a comemoração de seus 80 anos. Em seu livro, há uma preocupação em alternar comentários diretos sobre os fatos que dominavam o noticiário no momento da escrita e crônicas aparentemente atemporais e ambientadas em lugares longe do foco da mídia, mas cujas entrelinhas revelam a preocupação do escritor com seu cotidiano.
“Inicialmente, pensei em registrar os bons momentos, as coisas boas que aconteceram nos meus 80 anos, mas escrevi as alegres e as tristes”, disse Martinho ao Estado. Ele dividiu o livro em 12 partes, cada uma representando um mês do ano. E, a partir de sua percepção, o leitor consegue medir os diferentes graus de fervura que marcaram o ano passado. Assim, de janeiro e fevereiro, pode-se dizer que foram meses mornos, com Martinho já mencionando as primeiras homenagens que recebeu ao longo de 2018 por conta de seu aniversário, em 12 de fevereiro. É nesse período também que ele faz as primeiras referências ao escritor Lima Barreto. “A obra dele é importante literariamente”, explica. “E me inspiro em Lima quando escrevo sobre o dia a dia.”
O ano começa a se tornar atípico com o assassinato de Marielle Franco, em março. Martinho anota que esse mês, ao lado de abril, foram péssimos para o País – ao crime, junta-se a prisão de Lula. Os dias passam e a situação continua crítica: “Maio também foi horrível e junho foi triste”, anota ele. Um respiro foi um grande evento ocorrido no Teatro Clara Nunes, no Rio, no qual Martinho celebrou as bodas de prata com sua mulher Cléo.
O Brasil é desclassificado da Copa, com Neymar deixando a Rússia com a fama arranhada. O País também começa a viver a aventura da eleição presidencial – sobre a eleição de Bolsonaro, aliás, Martinho a descreve como “uma zebra inimaginável pelos caciques da política”. Mesmo assim, Martinho não se deixa abater: “Penso nas notícias ruins de uma forma otimista, pois creio que podemos melhorar o que está ruim”.