A palavra “comunismo” é frequentemente utilizada no cenário político brasileiro, muitas vezes como um rótulo pejorativo para descrever determinadas ideologias ou movimentos. No entanto, a realidade do comunismo, enquanto sistema político e econômico, é bastante distinta das acusações frequentemente feitas. Neste artigo, analisaremos se, de fato, o Brasil vive ou tem vivido sob o comunismo.
Em primeiro lugar, é importante compreender o que realmente significa comunismo. A ideologia comunista, conforme formulada por Karl Marx e Friedrich Engels, prevê uma sociedade sem classes, sem propriedade privada dos meios de produção, e onde o Estado, eventualmente, desapareceria, pois a administração da produção seria feita coletivamente. No entanto, essa visão utópica nunca foi plenamente realizada, mesmo em países que se identificaram como comunistas, como a União Soviética e a China, onde o Estado forte e centralizador se manteve.
No Brasil, não existe um regime comunista. O país é uma democracia representativa com uma economia de mercado, onde a propriedade privada é protegida por lei e onde as empresas privadas desempenham um papel central na economia. Partidos políticos com diferentes ideologias, incluindo os de esquerda, como o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), participam do processo democrático, mas eles operam dentro das regras e normas de uma democracia capitalista. Essas organizações defendem políticas progressistas, como a distribuição de renda e a ampliação dos direitos trabalhistas, mas estão longe de propor um sistema comunista.
Ademais, a retórica anticomunista no Brasil muitas vezes confunde políticas de bem-estar social ou redistribuição de renda com comunismo. Programas como o Bolsa Família ou a defesa de direitos trabalhistas são frequentemente classificados como “comunistas”, apesar de serem medidas típicas de estados de bem-estar social, comuns em muitas democracias capitalistas ao redor do mundo, como a Alemanha e os países escandinavos. Essas políticas buscam mitigar as desigualdades sociais e econômicas dentro do próprio sistema capitalista, e não o substituir por outro.
Por fim, é necessário considerar o uso do termo “comunismo” como uma ferramenta política. Nos últimos anos, a palavra tem sido usada como um espantalho para mobilizar eleitores contra qualquer proposta que se afaste da ortodoxia neoliberal ou conservadora. Essa estratégia busca polarizar o debate público, desqualificando adversários políticos sem um exame realista de suas propostas. Essa manipulação semântica, ao invés de esclarecer o debate público, contribui para a desinformação e a radicalização.
A ideia de que o Brasil está sob uma ameaça comunista é mais um mito político do que uma realidade. O país opera dentro de uma democracia capitalista, e as acusações de comunismo servem mais para fins retóricos do que para descrever uma situação factual. Para um debate político mais produtivo, é essencial que as discussões sejam fundamentadas em fatos e na compreensão correta dos termos e conceitos.
*João Moura é professor e filósofo, observador da anatomia de governos e sociedades.