Rolling Stones
Revisitando o blues que uniu Mick Jagger e Keith Richards
Publicado
emPedro Antunes
Com uma guitarra nas costas, o garoto de 17 anos viu, naquela estação de trem de Dartford, cidade no extremo leste da Grande Londres, outro rapaz com dois discos debaixo do braço. Keith Richards ficou encantado com os álbuns que Mick Jagger, aos 18, levava consigo.
Rockin’ at the Hops, de Chuck Berry, havia sido lançado em 1960, um ano antes daquele encontro. O outro era uma coletânea de Muddy Waters, o pai do Chicago Blues, subgênero nascido do Delta Blues com a adição da eletricidade das guitarras e baixos, piano e até instrumentos de sopro.
A história não é novidade. Assim nasceu uma das maiores parcerias da história da música e uma das maiores bandas de rock de todos os tempos. Tudo pelo blues daquele sul de Chicago impresso naqueles dois discos. Cinquenta e cinco anos após aquele encontro, depois de tantas pedras rolarem pela história daqueles dois, a voz de Jagger e a guitarra de Richards se encontram no mais puro blues.
Nasceu, de forma despretensiosa, Blue & Lonesome, o novo disco dos Rolling Stones, o primeiro em 11 anos, desde A Bigger Bang. O álbum chega ao mundo todo nesta sexta-feira, 2. A ideia era criar um álbum com músicas inéditas, tal qual o antecessor, responsável por trazer a banda em turnê para aquele que foi o maior show da carreira deles, na praia de Copacabana, para 2 milhões de pessoas. A grandiosidade das canções para multidões se apequenou. No lugar das novas canções, as velharias empoeiradas. Ao enfrentarem o monstro que é a criação, optaram por relaxar com um ou outro blues que formam a pedra fundamental da identidade sonora dos Stones.
A primeira testada foi Blue and Lonesome, de Memphis Slim e popularizada por Little Walter, sugerida por Richards. Aos poucos, as articulações das mãos do guitarrista já gastas pelos anos voltavam a desenhar pelo braço do instrumento que o acompanha há quase seis décadas. “Vamos fazer agora um Howlin’ Wolf?”, sugeriu Richards, na sequência. A experiência de tocar um blues para soltar cabeça e corpo para as novas composições foi mais do que um escape.
Em Blue & Lonesome, Jagger e Richards prestam uma devida e bonita homenagem por inteiro para o gênero que os uniu. Em meio a tanto acaso, tantos trens e plataformas pelas quais eles poderiam passar, se trombaram naquela manhã de outubro de 1961 para mudar o rumo da história. E se o blues não estivesse ali, na guitarra de um e nos discos do outro, a história seria outra.