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Rollemberg muda regra após quebrar porta do habite-se do Minha Casa, Minha Vida

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Marta Nobre e Bartô Granja

Há dois meses – mais precisamente no dia 16 de janeiro –, o governador Rodrigo Rollemberg inaugurou com pompas um condomínio no Riacho Fundo II, do programa Minha Casa, Minha Vida. Naquela ocasião, 1 mil 392 famílias receberam as chaves dos seus apartamentos.

Há 24 horas – exatamente na manhã de quinta-feira, 17 –, o mesmo Rodrigo Rollemberg sancionou a Lei do Polo Gerador de Viagens. A medida muda as regras para empreendimentos que provoquem o aumento do fluxo de pedestres e de veículos, e atende pleito da indústria da construção civil.

Resumindo: acaba com exigências legais para a concessão de habite-se. Mas, na realidade – e semelhante à nomeação de Lula para a Casa Civil para a Casa Civil de Dilma –, o Buriti segue a linha da “companheira” do Planalto, de tentar resolver mal as coisas antes de publicar os atos administrativos no Diário Oficial. O gesto de Rollemberg é uma casa de marimbondos, e acarretará muitos perigos futuros.

A Lei do Polo Gerador de Viagens, diz o Governo de Brasília, muda as regras para empreendimentos que provoquem o aumento do fluxo de pedestres e de veículos, visando diminuir a burocracia para a obtenção do alvará de Construção e da Carta de Habite-se. Porém, até o fechamento desta matéria o texto não tinha sido publicado no Diário Oficial do Distrito Federal, o que, no mundo do direito, implica forçosamente o cumprimento da legislação atual, tanto pelos cidadãos, quanto, principalmente pelo próprio governo.

Aos amigos, tudo – Pelas regras propostas, as construtoras ficam eximidas tanto de apresentarem o Relatório de Impacto de Trânsito (RIT), quanto de executarem as obras que amenizem as dificuldades criadas à população por seus empreendimentos, cabendo-lhes agora uma contrapartida financeira que poderá ser paga em 180 meses (15 anos). Caberá ao Detran e DER, elaborar o RIT e submetê-los a um comitê de mobilidade urbana. Foi o que afirmou Rollemberg. Detalhe: com o dinheiro arrecadado, o governo se responsabilizará por executar as obras exigidas no RIT. Sério mesmo?

Problema grave – O governo simplesmente não consegue aprovar projetos, soltar os Alvarás de Construção e as Cartas de Habite-se com a urgência que a economia de Brasília necessita. Exige-se de quem compra terrenos pela Terracap o pagamento em 12 meses, enquanto somente os projetos levam até três anos para a aprovação. Daí a agonia das construtoras.

O Relatório de Impacto de Trânsito virou o grande bicho-papão desse atoleiro, uma vez que não ocorrem investimentos inteligentes em transporte coletivo e mobilidade urbana, ou quando ocorrem são de péssima qualidade, a exemplo do BRT de Agnelo Queiroz, que resolveu pouco ou quase nada até agora. Os exemplos são palpáveis: faixa central na EPTG, Estação de Santa Maria e engarrafamentos desde o Valparaíso. No fundo, tudo não passou de gastança de dinheiro público.

Cavalo de Tróia – O remédio proposto por Rollemberg para o trânsito contém sérios efeitos colaterais: como o governo tirou das grandes construtoras o ônus de executarem as obras de mobilidade necessárias aos seus empreendimentos, transformando-as em contrapartidas financeiras parceladas em 15 anos, o futuro tornou-se bastante previsível: problemas à vista e soluções a prazo.

Vai sobrar para a sociedade, que sofrerá imediatamente os impactos no trânsito da cidade, e pagará essas obras de mobilidade com a mesma rapidez com que as construtoras embolsarão seus lucros, enquanto terão tempo suficiente para articularem uma forma de escaparem do compromisso. Outra possibilidade bem plausível é simplesmente o cidadão comum não ver obra nenhuma nesse sentido.

Assim, além do povo pagar o pato, absolutamente nada garante que o governo levará a sério os apontamentos feitos pelo Detran ou DER nos futuros Relatórios de Impacto de Trânsito. Como saber disso?

Amigos gozam facilidades – Todo tipo de facilidades e gentilezas vem sendo prestadas atualmente pelo Governo de Brasília a empreiteiras investigadas tanto pela Caixa de Pandora quanto pela Lava Jato. Dentre os maiores doadores para a campanha de Agnelo Queiroz em 2014 está a empreiteira OAS, com R$ 2,1 milhões.

A enrolada construtora OAS também contribuiu com R$ 250 mil para a campanha de Rodrigo Rollemberg. No meio dos contratos bilionários do GDF com a OAS e a JC Gontijo estão as obras do programa Morar Bem.

Em 30/04/2013, o RIT do Morar Bem da QS 21 no Riacho Fundo II alertou: “Concluímos que são condicionantes à operação do empreendimento (fase de obra – grifo da Redação) e deverão ser implantadas interseção em dois níveis (viaduto – grifo da Redação) na ligação entre a Avenida Recanto das Emas e o Riacho Fundo II, interseção em dois níveis nas proximidades da interseção entre a DF-001 e DF-475, nove passarelas de pedestres e deverão ser adequados o canteiro central e retornos. (…) AS MEDIDAS DEVEM ESTAR CONCLUÍDAS ANTES DA EMISSÃO DA CARTA DE HABITE-SE”.

DER

Assinaram o relatório nada mais, nada menos, que quatro engenheiros do DER. O “Habite-se” já saiu, mas onde estão os dois viadutos e as nove passarelas? Quem recebeu os imóveis populares está agora correndo risco de morte.

Habite-se na hora – Os processos, pelo menos dez, rapidamente arquivados, que tratavam da emissão da Carta de Habite-se para obras do Morar Bem no Riacho Fundo II, também testemunham a presteza com que o GDF trata a JC Gontijo.

No dia 29 de janeiro último – sexta-feira –, foi feita uma vistoria de “Habite-se” na obra do Morar Bem localizado na QS 25. No mesmo dia 29, a Administração Regional liberou a Carta de Habite-se nº. 009/2016. Logo depois Rollemberg inaugurou a obra.

Nunca se viu tanta competência, eficiência e celeridade, ironizam profissionais que atuam no setor.

Porém, quem transitava próximo ao local do evento durante a semana que antecedeu a festa não deixou de notar que a estrutura para a entrega dos apartamentos vinha sendo montada há tempo.

Ou seja, o circo já estava armado antes mesmo de os fiscais atestarem se as obras estavam corretas ou não, enquanto a Administração Regional aguardava com caneta na mão para soltar o documento, comprovando que as ações do Governo de Brasília estão sendo pautadas não pela seriedade com que os temas requerem, mas por uma agenda unicamente populista na tentativa de salvar sua imagem.

Não presta, mas e daí? – Fato marcante nessas obras, conforme destacaram reiteradamente os fiscais em seus relatórios, é que a qualidade e adequação às normas de segurança dos materiais utilizados eram péssimas. Portas, esquadrias, vasos sanitários e acabamentos em geral, bem como o próprio esmero técnico da execução, eram reprováveis.

“Conquanto a vistoria não apresente exigência pertinente às técnicas de construção ora descritas, haja vista a recomendação de que devemos nos ater à concordância da obra com o projeto, há a preocupação desta equipe quanto à vulnerabilidade das instalações, motivo pelo qual reforçamos necessidade da observância pelo(s) profissionais quanto aos itens apontados. Diante disso, sugerimos que os responsáveis técnicos juntem aos autos um laudo técnico que ateste sobre a segurança, a salubridade e a durabilidade dos materiais empregados”, apontaram os fiscais.

Ouvidos por Notibras, especialistas destacaram a frase “haja vista a recomendação de que devemos nos ater à concordância da obra com o projeto”.

Em miúdos, os fiscais da Agefis estão trabalhando debaixo de tal pressão que ficaram “proibidos” de se meterem onde não foram chamados para não atrapalhar os contratos bilionários das empreiteiras doadoras de campanha, mesmo que muitos sejam engenheiros ou arquitetos com anos de experiência em campo. Esse método de fiscalização absolutamente superficial vem sendo chamado carinhosamente pelos fiscais de “Cara-Craxá”.

Nunca te vi, não te conheço – Outra coisa estranha é que as Guias de Controle de Fiscalização dessas obras estão absolutamente em branco, como também aponta o Processo do Morar Bem da QS 21.

A Guia de Controle de Fiscalização de Obras equivale ao prontuário de um paciente no hospital. Tudo que acontece na execução de uma obra, pública ou não, deve ser, por força do Código de Edificações e Normas da Agefis, anotado meticulosamente na Guia de Obras em visitas com intervalo máximo de 60 dias.

Entretanto, apesar de o Alvará de Construção nº. 52/2013 datar de 08/05/2013, nunca, em tempo algum, houve sequer uma única visita da fiscalização. É o que o documento permite deduzir. Ou seja, durante todo esse tempo, a obra só viu fiscal na hora do “Habite-se”, na véspera da inauguração. “Assim é brincadeira. O Ministério Público tem que investigar”, sugere um fiscal que prefere manter o anonimato.

Enquanto milhares de particulares e construtoras no Distrito Federal aguardam em filas sem fim pela aprovação de projetos na CAP – Central de Aprovação de Projeto, no DER-DF pelo Relatório de Impacto de Trânsito, na Agefis pelo Relatório de Vistoria de Habite-se e nas Administrações Regionais pela Carta de Habite-se, doadores de campanha têem “foro privilegiado”.

Questiona-se, nesse caso, a isonomia. E fica uma pergunta no ar: quem não cumpriu a lei antes, vai cumprir agora?

O trânsito de Brasília que aguarde para ver.

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