O homem holográfico
Romeu, criador, é tomado pela volúpia de Julieta
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Passeava pelas ruas como um morador.
Permitia-se atravessar fora das faixas assustando motoristas e pedestres.
Freadas bruscas, gritos de horror; sempre ileso de todas as situações que se metia, subia pelas paredes dos prédios e projetava o rosto em laterais de edifícios que ficassem à vista da multidão.
Assim se divertia.
Romeu dedicou a vida à pesquisa digital: miragens e ilusões em dimensões. Aprofundou estudos para tornar vivo o processo holográfico e experimentar a omnipresença. Tornar-se Deus do Olimpo.
Deixou de ser um cidadão comum. Tornou-se um holograma de si.
Escolhe local, espaços e com quem deseja interagir.
Acredita no poder holográfico da realização pessoal.
Passeia pelo mundo com soberba científica. Convencimento que pretende dominação.
Por trás de seus hologramas esconde segredos.
Diverte-se no olhar a distopia, distorcida, estratégias de jogo que favorece o controlador.
Tecnologia que o coloca em qualquer lugar do planeta; sempre só.
Desprovido de amor.
Saboreadas todas as possibilidades de manipulação, envolveu-se num experimento audacioso. Quer provar que o amor pode ser criado aos moldes desenhados.
Cunha um holograma de mulher ao seu ideal; trabalho incansável e especial porque surgiria uma relação matrimonial perfeita.
Pronta, a musa, a consagra em cerimônia particular – pacto de união – não prevendo probabilidades de erro.
No início, a lua de mel, a beleza explorada, tudo nos moldes de um holograma perfeito.
Com o tempo, Romeu enjoa.
Quer desfazer o holograma.
Julieta, por ironia assumida, se dá conta de que será destruída.
Em relance humano transforma a vida amorosa em inferno.
Exige sexo a todo o momento, insaciável, tornando-o assim escravo de sua volúpia.
Romeu não sabe como agir, diante da natureza humanizada e sujeita a erros.
Sua holografia não previu a necessidade de alteração ou correção no sistema. Parece que será sempre confrontado por Julieta.
Entende, agora, o sofrimento às avessas da história romântica do amor entre adolescentes.
Este pensamento o enlouquece.
Quer o silêncio perdido.
Quer entendimento não programado.
Cansado do plano perfeito, quer voltar a ser um cidadão comum, esconder-se das redes, libertar-se do emaranhado criado.
Mas sua estrada está traçada. Será o holográfico que virou holograma na busca de sua identidade.
Perdeu-se no mundo digital.
Seu projeto de mulher superou o seu de homem.
Confiou nos seus anseios, não percebeu que o perigo da cultura machista, que acabou por devorá-lo.
Julieta permanece em prontidão.
Mostra as consequências bumerangues sobre quem “brinca” com o universo feminino, e assim como na Odisseia 2001 tomou o poder da manipulação holográfica de seu agora, escravo Romeu.
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