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Vizinho de Vinicius

Rua Nascimento e Silva, 378… ali se fez rock imortal

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Mário Magalhães

Na entrada do pequeno prédio da rua Nascimento Silva, 107, duas placas celebram o local onde Tom Jobim, como eternizam os versos de Vinicius de Moraes, ensinou “pra Elizeth as canções de Canção do Amor Demais”. Era lá que Tom vivia no finzinho dos anos 1950, à altura do parto da Bossa Nova. Justíssima reverência.

Três quarteirões à frente, no outro lado da mesma rua de Ipanema, quem passa não vê homenagens. Porque inexistem. Mas a música também deve muito ao lugar. No apartamento 201 do edifício número 378, Renato Russo criou letras e melodias que seus contemporâneos não esquecem e as novas gerações descobrem encantadas.

Renato chegou em 1990. Enquanto ali morou, saíram três discos da Legião Urbana gravados em estúdio, além de dois exclusivos do líder da banda. Para o retrato da capa de um álbum, ele posou na porta estreita do prédio de três andares com fachada de tijolo aparente.

O apartamento conservado quase como estava duas décadas atrás não parece um museu. Nele a vida pulsa tanto que pode até constranger quem, com jornada mais longeva, não teve nem de longe a vida tão vivida de Renato.

Na sala, espalham-se treze caixas com preciosidades como desenhos feitos por Renato com giz de cera _de Isadora Duncan, Jesse James, Rimbaud. Há composições inéditas, peça de teatro, esboço de ópera, gravações, poemas desconhecidos. Tudo da lavra do morador de outrora.

E mais de cinquenta cadernos manuscritos, que expõem a carpintaria criativa, versão após versão, de clássicos como “Eduardo e Mônica”, composto antes da mudança para Ipanema. Esses diários reconstituem festas de arromba, esmiúçam amores e desamores, segredam bastidores do rock’n’roll. Trevos de quatro folhas resistem entre as páginas.

Em armários no corredor, permanecem as camisas estampadas vestidas nos shows. A biblioteca tem biografia de Jean Genet e livro com letras de Chico Buarque. Um quarto abarrotado de CDs e vinis guarda de Richard Wagner aos Menudos. Noutro, reparei que a cama de Renato era de solteiro, como a de Fernando Pessoa em Lisboa.

O tesouro da rua Nascimento Silva começou a ser conhecido numa coleção de livros de Renato editada pela Companhia das Letras. Só por hoje e para sempre, volume de estreia, contém os textos escritos durante uma internação para combater a dependência química.

Em setembro de 1996, a Legião lançou o disco A Tempestade. Renato, aos 36 anos, estava enfraquecido pela Aids. Ele cantou: “Hoje a tristeza não é passageira/ Hoje fiquei com febre a tarde inteira/ E quando chegar a noite/ Cada estrela parecerá uma lágrima”.

A Wikipedia informa que Renato morreu em casa um mês mais tarde, em outubro – faz vinte anos em 2016. Acho melhor corrigir: Renato Russo é imortal.

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