Por mais amarras que tentassem colocar na Ruth, ela conseguia se desvencilhar até com certa desenvoltura. É verdade que, vez ou outra, a mulher se via em emaranhados repletos de nós de marinheiro. Mesmo assim, a danada se contorcia para cá, se contorcia para lá, dava um sacolejo e vida que segue.
— Pior mesmo é viver com um nó cego, Margarete.
— Ah, Ruth, só você pra me fazer rir um pouco.
Quem era Margarete? Colega de trabalho da nossa Ruth. Era devidamente casada com Onofre, com quem possuía quatro filhos.
Ruth e Margarete levavam a vida como caixa de supermercado. Vida ralada, mas que dava para pagar as contas, ainda mais para a primeira, cujo marido, o Lúcio, era afamado mecânico em São Sebastião. O casal possuía uma penca de sobrinhos, o que afastava qualquer pretensão, por mais tentadora que fosse, de ter herdeiros.
— Mas, Ruth, não é possível que você não tenha vontade de ter seus próprios filhos.
— Até tenho, Margarete.
— Então?
— Então, o quê?
— Então, já não tá na hora de ter filhos?
— E agora tem hora para ter filhos, Margarete?
— É modo de se falar.
— Hum!
— Então?
— Margarete, toda vez que essa vontade de ser mãe acomete o meu ser, convido um dos meus sobrinhos para passar o dia lá em casa.
— E não é bom?
— Ótimo, mas fica melhor ainda depois que o moleque vai embora.
Apesar dos pensamentos incongruentes, as duas mulheres eram tão chegadas, que até brigaram com o gerente quando ele quis colocar a Alice, outra funcionária, no caixa ao lado da Ruth. Pra quê? Margarete e Ruth disseram horrores para o homem, que não teve escolha.
— Tá bom, tá bom! Já entendi! Podem ficar sossegadas, que vocês duas vão continuar trabalhando lado a lado.
Tal imbróglio, aliás, aconteceu justamente no último Dia dos Namorados. Questão resolvida, lá foram as duas amigas para os respectivos caixas, quando um belo exemplar do sexo masculino entrou no recinto. Não um espécime qualquer, mas daqueles que facilmente figurariam nas antigas fotonovelas.
— Você viu aquilo, Margarete?
— Vi o quê, mulher?
— Hum! Tu vai querer me dizer que não olhou pro bofe?
— Ruth, sou uma mulher casada.
— E daí?
— E daí o quê?
— Daí que hoje é Dia dos Namorados, não é dos maridos.
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Eduardo Martínez é autor do livro 157 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’
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