Salete e Lorraine, hoje mulheres já passadas dos 40 anos, se conheciam desde a infância. E, apesar da longa convivência, e talvez até mesmo por conta dela, não se suportavam. No entanto, até mesmo por conta das aparências, nunca se confrontaram de modo a não restar qualquer dúvida de tantas desavenças. Talvez, quem sabe, até gostavam das alfinetadas mútuas.
Salete, certamente a mais ardida das duas, não perdia oportunidade para apezinhar a conhecida. Mas não pense você que ela queria distância da outra. Não mesmo! Como gostava de dizer, a proximidade era necessária para não ser pega de surpresa pelas garras do tigre. Quer dizer, no caso específico, da tigresa.
Lorraine, que havia jogado fora o resquício de inocência ainda na adolescência, tinha certo apreço pela rival. Tanto é que, não raro, a defendia de possíveis línguas ferinas. Se alguém quisesse falar mal da Salete, que escolhesse outras orelhas para escutar tamanhos desaforos. Não sabia se a outra tomava a mesma atitude, mas fazia questão de manter a discórdia reservada de olhares curiosos. Que fossem procurar fofocas em outros lugares!
Certa feita, por mais um desses acasos da vida, aquelas mulheres se encontraram em uma loja de roupas. Salete, um tanto acima do peso, procurava um vestido para disfarçar as gordurinhas. Já Lorraine, sempre com o corpo em dia à custa de dieta rigorosa, buscava algo que destacasse a silhueta.
Mal se viram, as quase amigas se cumprimentaram com sorrisos carregados de cinismo. Em seguida, cada uma foi em busca do modelo que melhor lhe caía. É verdade que, de vez em quando, uma lançava olhares sobre a outra, até que, finalmente, Salete, que já estava com o vestido novo dentro da sacola, passou pela antagonista.
Lorraine, vaidosa que era, não cansava de se admirar em frente ao amplo espelho. Mas estava na dúvida entre dois vestidos, o que ela estava usando e outro em suas mãos. E, aproveitando que a adversária estava por ali, não resistiu e puxou conversa.
— Salete, minha amiga, o que você acha que cairia melhor em mim?
— Um raio!
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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