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Caso de polícia

Santana, o sem-noção, volta com defunto no colo

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Reprodução/WallHere

Era mais uma diligência, entre tantas realizadas nos últimos quase 20 anos trabalhando na polícia. Santana, ao entrar na viatura, tentou empurrar o banco para trás na ânsia de acomodar a barriga proeminente. A colega, sentada ao lado, obrigava-o a encolher a pança, mesmo porque Santana ainda guardava certa vaidade, já que mal havia suplantado a barreira dos 50. Os cabelos, cada vez mais ralos, eram jogados para o lado. Que deprimente, como se ninguém houvesse notado a calvície reluzente. Ah, Santana, por que teimas em ser tão patético?

Lá ia o nosso quase estimado herói, apesar de possuir um distante perfil daqueles que costumam ser retratados no cinema. Santana não era um Clint Eastwood ou um Bruce Willis. Era evidente que ele estava fora de forma. Aliás, alguns professores de matemática poderiam até contestar tal afirmação, já que o redondo, ou melhor, a esfera também é detentora de uma forma. E tem até fórmula para que o seu volume seja calculado com precisão, apesar de que até o próprio Santana, certamente, não quisesse saber o resultado. “Já fui magro!”, ele sempre dizia a mesma coisa para todos.

O caminho foi longo, pelo menos para o Santana, que não conseguia respirar direito tentando encolher a barriga. Todavia, a viatura acabou estacionando em frente à casa 28, cuja pintura há tempos se encontrava desgastada. Seria amarela ou branca? Talvez verde. Seja como for, esse era um detalhe que não precisava ser levado em conta.

A colega prontamente desceu do veículo, enquanto Santana disse que iria fumar um cigarro antes. Ela nem deu bola e já foi conversar com a senhora de vestido florido, apesar de chorosa, à porta. Que alívio o Santana sentiu!

Ele nem queria fumar, mas o hábito o fez colocar a mão no bolso e sacar um cigarro amarrotado. Ao mesmo tempo, por causa do tempo tentando esconder a pança, houve uma aglomeração de gases intestinais, que foram expelidos compassadamente. Infelizmente, para o Santana, soou-se certo estrondo, que fez a colega se virar para ele. Que vergonha, Santana!!! Ele até ficou temeroso em acender o seu cigarro, que já estava no canto da boca. Afinal, aquilo poderia se tornar um caso para o Corpo de Bombeiros.

Depois de dar umas abanadas com as mãos, o Santana criou coragem e acendeu o tal cigarro, que já apresentava certa umidade por causa do longo contato com os lábios. Deu uma copiosa tragada, olhou ao redor alguns curiosos. Empertigou o corpo, o que lhe causou certo desconforto na lombar. “Já fui atleta!”, ele insistia em falar para os que ainda suportavam sua ladainha.

O velho policial tentou puxar pela memória, mas não se lembrava da razão pela qual estava lá. Ainda assim, preferiu entrar na residência a fim de dar apoio à colega. Virou-se e foi em direção à porta.

Mal entrou na sala, avistou uma enorme televisão ligada, enquanto um velho, sentado no amplo sofá carcomido, parecia cochilar. A colega e a senhora conversavam na cozinha.

O Santana, apaixonado desde criança por futebol, começou a prestar atenção na partida que era televisionada. Internacional e Santos pareciam travar uma batalha sem muito glamour. Não havia Pelé, não havia Falcão. Mas a paixão pelo esporte bretão fez com que o Santana perdesse qualquer timidez e, então, acabou por bem se acomodar ao lado do velho, no exato momento em que adentravam na sala a colega e a senhora.

Sem se fazer de rogado, o Santana deu um leve tapa na batata da perna do velho e perguntou: “E aí, quanto está o jogo?”. A colega e a senhora, que há pouco se descobriu viúva, olharam abismadas para a cena. O Santana acabara de tombar o defunto sobre seu colo.

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