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Santana (o sisudo), o pregador preso e o ateu

Lá estava o Santana em mais um dia caótico na delegacia. Gente falando a todo vapor pelos cotovelos, como se aquilo fosse uma filial da bolsa de valores. Ele, que já chegava com ânimo de ir embora, levantou o gordo traseiro e se arrastou até a cozinha. Mal entrou, viu o Guilherme, um policial recém chegado naquela delegacia.

– Qual é mesmo o seu nome, cana?

– Guilherme.

– Hum… Deus deve estar com raiva hoje, você não acha?

– …

Como Guilherme apenas abaixou os olhos, Santana, usando todo seu tirocínio policial, ficou com a pulga atrás da orelha.

– Você não acredita em Deus, né?

– Tenho que voltar lá pra frente. Muita gente pra atender hoje.

O dia se arrastou com a lentidão de uma lesma com cola nos pés. Obviamente que lesma não possui pés e, por isso mesmo, os ponteiros do relógio pregado à parede pareceram ainda mais vagarosos. E, já no finalzinho do expediente, eis que alguns policiais entram na delegacia com um homem algemado, que gritava aos quatro cantos que ele era da igreja. Isso, aliás, fez com que despertasse no Santana um certo desejo de vingança contra o Guilherme. Ele se aproximou do preso, que havia sido colocado em um banquinho de cimento no canto.

– Você é da igreja mesmo?

– Sim, senhor!

– Tá vendo aquele cara ali no balcão? Pois é, ele é ateu.

Nisso, o preso lançou um olhar de consternação contra o Guilherme, que a princípio nem percebeu, assim que o homem começou a citar algum trecho da bíblia. O policial não deu muita trela, até que a ladainha continuou.

– Como é que você pode não acreditar no Nosso Senhor Jesus Cristo, irmão?

Santana, que a tudo assistia, tentava conter as gargalhadas. Então, Guilherme se levantou, como se fosse em direção ao pregador. Mas, antes que desviasse para a mesinha do café, disse para o preso, sem mesmo fitá-lo.

– Se estou aqui, é simplesmente porque é meu trabalho.

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