Bicho infeliz esse tal de homem. Tem peito sem leite, ovos sem casca, passarinhos sem asa e, o pior de tudo, tem saco sem dinheiro. Não é o fim do mundo. Afinal, em terra de gigantes, o melhor cenário é o macho, alfa, beta ou gama, se imaginar viajando em uma propaganda de uma marca qualquer de refrigerante. Existem muitas possibilidades de marcar positivamente a experiência de um ser humano do modo masculino aqui na Terra Brasilis. Algumas são simples e eficientes. Falando como um desses, vale a pena lembrar, por exemplo, que dinheiro não traz felicidade, mas compra cerveja, que é quase a mesma coisa.
Acostumado a esperar o bem que vem dos males, já experimentei de tudo nessa vida de Padim Ciço Romão Batista e de São Jorge, meu santo de frente e de costas. Vindo de dona Guigui, minha santa mãe, foram doses cavalares de remédios para memória, para engordar, emagrecer, pegar grossura de homem e, principalmente, para controle de bichas. Adolescente e jovem, não tinha argumentos para recusar o Postafen, muito menos o Fosfosol, Óleo de Rícino, Biotônico Fontoura, Cibalena e o Melhoral. Desses, o que mais gostava atendia pelo pomposo nome de Rum Creosotado. De todos os que já usei, era o que descia melhor até as tripas grossas e finas.
Na verdade, fui convencido de sua eficácia após ler no bonde do bairro a seguinte propaganda: “Veja ilustre passageiro o belo tipo faceiro que o senhor tem a seu lado. E, no entanto, acredite, quase morreu de bronquite. Salvou-o o Rhum Creosotado!” Nunca vi ninguém ao meu lado, mas, escondido da véia, passei a tomar a beberagem para quase tudo, inclusive tosses, micoses, chatos, piolhos, fimose mal ajambrada, pingamentos e hemorróidas. Lembro de tê-la indicado para meu avô Aristarco Pederneira de Araújo, vítima antiga de uma doença pouco conhecida naquela época: a paumolescência.
Apesar da falta de oportunidade para confirmar a serventia do medicamento, posso garantir que a alegria diária do vô me impõe o atesto de certificação do bálsamo consolativo. Recapitulando as dificuldades do homem na vida no pós-morte, o melhor registro a fazer é que é preciso ter força, coragem, raça, graça, sonho e muita grana. Seguindo as leis de Milton, o Nascimento, o que importa é ouvir a voz do coração. Mais importante do que tudo é que qualquer maneira de amar vale a pena. Usei isso na vida física e espiritual. Por exemplo, membro emérito da Igreja Presbicheriana, batia ponto diariamente na coirmã Igreja das Biscaterianas Sonhadoras.
Sem jamais ter pulado amarelinha sem segundas intenções ou passado anel sem terceirização dos objetivos, confesso que passei ao largo dos trenzinhos com vagões recheados de tomadores no Forever. Originários da fase em que Clodovil Hernandes, Denner, Rogéria, Cazuza e Pablo debutaram nos bailinhos produzidos por Chico Recarey e Ricardo Amaral no interior paulista, essa turma de entendidos pelo menos mostrou ao mundo que ao homem que reclama de tapa na cara falta o experimento manual do fio terra. Dizem até que a prática do aterramento facilita a conexão entre duas almas destinadas a ficarem juntas.
Pode até faltar pilhas, mas, no fim e ao cabo, certamente um dirá para o outro: Não precisa ativar minha localização, pois todo mundo sabe que eu tô na sua. Ou seja, se o amor tem mais de metro, onde ele bate fica. A moral da história é que falta aos homens um monte de coisas boas, mas a que temos não é de todo ruim. Por exemplo, vivo considerando a filosofia contemporânea de Woody Allen. Como o cineasta, eu não tenho de morrer, mas não quero estar in loco quando isso acontecer. Não tenho opinião formada sobre o fio condutor do curto-circuito, mas, sem vocação para eletricista, prefiro usar o dedo médio para coisas mais frugais. Sendo frugal, é difícil parar no hospital. Resumindo o resumo, levo a vida como ela é.
*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras