Desde dezembro, mês em que o novo presidente da Argentina, Javier Milei, tomou posse, venho tentando encontrar pelo menos uma razão para o mandatário ter mandado esculpir no bastão presidencial os focinhos dos cinco cachorros sob sua tutela. O argumento é que os bichinhos são seus conselheiros. Não sei se pelo excesso de criatividade, pela falta dela ou se pela ausência total de maturidade para exercer cargo dessa envergadura, cheguei a ter dúvidas sobre o futuro del pueblo portenho. A exemplo dos brasileiros adeptos do despotismo, os argentinos da mesma linhagem escolheram mal seu tirano. Como nós, eles mereciam um Nero menos napoleônico.
Data vênia, peço desculpas antecipadas aos vizinhos argentinos. Pelo menos no quesito peitar a idiotice eles são muito melhores e mais corajosos do que nosotros. Desafiaram o poder absoluto de Javier, reagiram rápido e, de alguma maneira, obrigaram o Judiciário a revogar parte dos “decretaços” de sua insolência mais próxima dos Pampas. Antes de completar um mês no poder, já foram três manifestações contra o cabeludo e mal ajambrado presidente. E virão outros. Muitos outros. Além de aumentar o valor do dólar oficial em 100%, passando de 400 para 800 pesos, Milei também demitiu servidores e reduziu os subsídios à energia e ao transporte, causando aumento das tarifas dos serviços públicos.
Para sorte de los hermanos, por duas vezes em uma semana a Justiça local suspendeu a louca reforma trabalhista de El Loco. Irado, o povo aplaudiu com as mãos trocadas, saiu às ruas e já lhe “prometeu” algumas carretas de votos para uma provável jubilação. Dizem os técnicos em economia local que a estratégia de Milei para reerguer a Argentina é acabar com o país de Diego Maradona e Lionel Messi. Tomara que o buraco não seja tão grande como é o do Amazônia pós-mito e seus meninos de estimação. Na prática, Milei mostrou ao mundo que não é somente um poço de sabedoria.
É uma ameaça ao continente e um portentoso candidato ao cargo de substituto de Nicolás Maduro e do colega brasileiro no palco das peças baseadas em besteirol. Aprendeu rápido as maluquices dos estultos. Vale lembrar que, por aqui, a pretexto de resolver problemas sociais e econômicos e atender a apelos de mui amigos, o compadre de maldades literalmente botou fogo no país. No período, o desmatamento da Floresta Amazônica alcançou cinco recordes anuais seguidos. E não foi só. O crescimento das queimadas atingiu 150% durante os quatro anos do desgoverno anterior. Na média, foram cerca de 3 mil campos de futebol perdidos por dia, o equivalente aos estados de Alagoas e Sergipe.
Ainda que atraia menos atenção do que a vizinha Amazônia, o Gran Chaco da Argentina tem um dos maiores índices de desmatamento do mundo e já perdeu mais de um quarto de sua área florestal. Milei não pode ser acusado dessa mazela. Todavia, em nenhum momento da campanha manifestou alguma preocupação com o ecossistema do país. O continente espera que ele não siga o exemplo do guru brasileño e, em algum momento de sua administração, perceba que uma floresta viva vale muito mais do que uma morta. Artista frustrado e economista sem lastro, resta-nos torcer para que El Loco tenha clareza e discernimento suficientes. Se preocupar com algo que não gera ibope imediato pode lhe custar o mandato.
Embora respeite os atributos arquitetônicos e culturais da Argentina, pouco tenho a ver com o insucesso do governo Milei ou com a desgraça econômica dos argentinos. O que verdadeiramente me preocupa é a possibilidade de Javier manter seus posicionamentos extremistas e se aproximar ainda mais do ex-similar tupiniquim. Se isso ocorrer, corremos o enorme risco de ter de aturar mais uma dessas horrorosas duplas sertanejas que pululam pelo Brasil. Entre dores, dúvidas, lamentações, golpes e tragédias provocadas pelo “gente boa” e pelo “simpatia”, o mercado dos horrores já tem um nome definido para o compadrio: Purgante e Efeito.