Entrevista/Eduardo Martínez
‘Ser cronista é colocar uma pitada de tempero na vida do jeito que ela é’
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emDa minha varanda voltada para a vasta paisagem da metrópole, aqui no Paraíso, em São Paulo, aguardo, deitada preguiçosamente na rede, a hora da entrevista por vídeo-chamada que marquei com Eduardo Martínez, autor do recém lançado livro cuja leitura, de cara, já me encantou: 57 CONTOS E CRÔNICAS POR UM AUTOR MUITO VELHO.
Na chamada, deparo-me com o charmoso coroa de cabelos grisalhos, de aparência muito mais jovem e jovial do que o título do livro sugere. Ele vai conversando comigo de seu apartamento, em Porto Alegre, entre uma e outra xícara de café, enquanto eu vou acendendo uns cigarros.
De início, Edu é tímido, mas vamos ficando íntimos, e ele vai se soltando. A seguir, trechos do nosso bate-papo:
Edu, por que você é escritor?
Cecília, creio que é porque sempre adorei ler e mandar cartas. A escrita, então, está presente na minha vida desde muito cedo.
Para quem você escreve?
Engraçado que, talvez, as pessoas imaginem que o escritor escreva para um monte de pessoas. Mas penso que isso não é verdade. Escrever é um ato solitário, mas que é dirigido a alguém. Por isso, os leitores se sentem destinatários do escritor. É como se o escritor estivesse lhe mandando uma carta. E quem escreve cartas precisa cativar quem irá recebê-la.
Como você gostaria que as pessoas pensassem em você e na sua obra?
Quanto a pensar em mim, não sei. O escritor não é um astro do rock ou do cinema. Podemos sair tranquilamente na esquina para comprar pão sem que as pessoas pulem no nosso pescoço. Nas poucas vezes que alguém me reconheceu e veio conversar foram momentos muito legais, mas que não são capazes de me fazer tirar os pés do chão. Quanto à minha obra, é lógico que gosto de receber elogios. Isso massageia o ego. Todavia, há algumas pessoas que reclamam sobre determinados finais, pois querem que tudo seja lindo e maravilhoso. No entanto, a vida não é assim.
Estava aqui dando uma lida no seu livro e fiquei imaginando de onde você tira tantas ideias.
Pois é, Cecília, creio que o escritor precisa ficar atento ao que acontece ao redor. O modo de olhar uma fotografia, ouvir uma frase que possa ser usada em alguma história. São muitas coisas que servem como ponto de partida. Anoto tudo para não esquecer.
57 CONTOS E CRÔNICAS POR UM AUTOR MUITO VELHO não é o seu primeiro livro. Vi que você escreveu outros, inclusive DESPIDO DE ILUSÕES.
É verdade. Também escrevi alguns outros, mas em 2012 parei de escrever. Isso até que a minha esposa, a Dona Irene, me convenceu a voltar a escrever. Aconteceu exatamente no dia 23/12/2021. Então, comecei a escrever compulsivamente contos e crônicas, que acabaram sendo utilizados por professores no Rio de Janeiro e em Brasília.
Edu, você que é um escritor premiado e publica contos e crônicas diariamente, como é saber que seus textos são lidos por estudantes?
Cecília, é a parte mais gratificante. Inclusive já visitei algumas turmas em uma escola em Brasília, alunos do professor Leandro Mendes. É algo tão incrível, que preciso me beliscar para ter certeza de que não estou vivendo um sonho.
Soube que você mora num apartamento que pertenceu ao Caio Fernando Abreu. Como é morar no mesmo local que viveu um dos maiores escritores brasileiros?
Pois é, Cecília, isso foi uma surpresa para mim. Às vezes, enquanto escrevo, fico olhando ao redor da sala e imagino o Caio me olhando e dizendo: “Ei, cara, melhor trocar essa palavra por outra!”
Os 57 contos e crônicas deste livro são muito bons. Eu coloco A CARTA E A URNA como um dos maiores contos que já li. Como surgiu essa história?
Engraçado você falar isso, pois é um dos meus favoritos. A ideia surgiu a partir do desprezo que o homem é capaz de possuir em relação ao outro. A partir daí, enquanto comecei a escrever, a história foi se formando na minha mente. Gostei muito do que escrevi. Tanto é que pedi para a minha mulher ler em voz alta. Assim que terminou, ela arregalou os olhos e disse: “Edu, esse conto está incrível!”
Já te falaram que você possui a escrita muito fácil e prazerosa de ser lida?
Sim. A minha esposa até brinca com isso, pois diz que sou o escritor mais facinho que ela conhece.
Ela está certa (risos). Edu, o que o leitor pode esperar de 57 CONTOS E CRÔNICAS POR UM AUTOR MUITO VELHO?
Cecília, essa seleção de contos e crônicas passou por um criterioso crivo. A Dona Irene e outras pessoas participaram da escolha, entre as quais o jornalista José Seabra, o escritor e poeta Daniel Marchi e o professor Leandro Mendes. O professor José Geraldo de Sousa Junior, ex-reitor da UnB, e a jurista Soraia Mendes também leram as histórias antes de eu encaminhá-las para a Joanin Editora. Por isso, penso que o leitor irá ter uma conexão muito gostosa com o livro.
O que eu não perguntei que você gostaria de ter respondido?
A leitura é fundamental para fazer o ser humano pensar. O livro não é algo pronto e acabado. Isso porque o leitor é parte não passiva da trama. Ele precisa criar imagens para visualizar a história, as personagens, as paisagens. Além disso, o livro não acaba com o fim, pois nos acompanha por dias, meses, anos e, em alguns casos, durante toda a vida. Uma vida sem livros é uma vida vazia, triste e sem sentido.
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