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Sede e fome

Sertão vive assustado com cada vez mais histórias de terror

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Autor/Imagem:
Cadu Matos - Foto Francisco Filipino

Elas quase se esbarraram em uma esquina. Recuaram, olharam-se, devem ter gostado do que viram, pois os olhos das duas brilharam.

Ambas eram jovens, aparentando 18-19 anos. Ambas bonitas, podiam até ser chamadas de atraentes. Duas mulheres de cabelos escuros e tez anormalmente pálida. Mas a identidade maior que partilhavam era sua condição de existência: ambas estavam mortas.

Se as semelhanças paravam por aí, as diferenças eram gritantes. A de cabelos compridos era uma vampira recém-transformada. Já a de cabelos curtos – que podia ser descrita de muitas outras formas, como a do andar trôpego, ou a que babava – era uma zumbi contaminada de pouco. Mas a diferença maior estava naquilo por que ansiavam, e que as faria prosseguir em sua trajetória de horrores.

A vampirinha estava morrendo de sede, sonhava em beber o sangue do primeiro ser vivo que encontrasse. Por sua vez, a zumbizinha estava morrendo de fome, queria dilacerar os tecidos do primeiro vivente com que se deparasse e comer até fartar.

Quis o destino que as duas mortas-vivas se encontrassem. E se atacassem.

E se atracassem.

Mais ágil, a vampirinha conseguiu cravar os caninos afiados na jugular da vítima. Mas o sangue que absorveu não satisfez plenamente sua sede, era um sangue de cadáver, frio, que não pulsava. Mesmo assim chupou-a, seria quando muito um alívio momentâneo para sua sede.

Por sua vez, a zumbizinha cravou os dentes nas coxas bem torneadas da outra. Comeu-a, dilacerando suas carnes tenras, mas não teve como alcançar o cérebro para transmitir-lhe a condição de zumbi. (Diga-se, não tenho a menor ideia se um zumbi pode contaminar um morto-vivo, aceito esclarecimentos.)

O encontro das duas foi breve, menos de 10 minutos. Ao se afastarem, não tinham os rostos corados, vampiros são pálidos e zumbis, igualmente; mas foi como se tivessem. Seguiram em direções opostas, a vampira mancando, sem um pedaço da coxa, a zumbi quase sem sangue (o que não lhe fazia muita falta), ambas em busca de presas que pudessem saciar sua sede e sua fome.

Antes de irem embora, trocaram um beijo tórrido – que quase custou os lábios das duas, mordidos com toda força – e marcaram, por mímica, um encontro para a noite seguinte. Seria um segundo embate, dessa vez de natureza sexual. Duvido que role.

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