Em meio à ofensiva do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para barrar o avanço de “fake news” na campanha de 2018, entidades da sociedade civil reagiram à inclusão do Exército, da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e da Polícia Federal (PF) nas discussões, temendo que haja margem para excessos e ameaça à liberdade de expressão.
O TSE prepara uma força-tarefa para combater a disseminação de “fake news” (notícias falsas) nas disputas do próximo ano. Integrantes do tribunal já se reuniram com representantes do Google e do Facebook para tratar do tema.
Para Marco Konopacki, coordenador da área de Democracia e Tecnologia do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS-Rio), a intenção do TSE é legítima, mas ele alerta sobre a participação de órgãos de segurança nacional no debate. “Isso pode descambar para um vigilantismo exacerbado, num processo de autoritarismo”, avaliou Konopacki.
O professor Sérgio Amadeu, um dos representantes da comunidade científica no Comitê Gestor da Internet no Brasil, concorda. Para Amadeu, o TSE deveria reunir especialistas, juristas, técnicos e acadêmicos para organizar um “guia de boas práticas” na internet.
“Não cabe ao Exército, que deve cuidar da estratégia de defesa do Brasil, participar de um debate que tem a ver com opiniões políticas de disputas partidárias. Isso é um absurdo. Acho estranho que a Polícia Federal e a Abin trabalhem essa questão, porque isso foge da competência delas”, criticou Amadeu.
Segundo o advogado Bruno Bioni, do Núcleo de Informação e coordenação do Ponto BR (NIC.br), entidade ligada ao Comitê Gestor da Internet no Brasil, o TSE deveria promover uma discussão “mais democrática”. “O primeiro passo seria pensar num arranjo que tivesse acadêmicos, setor privado, ONGs, que não ficasse só numa discussão com atores governamentais”, comentou Bioni.
Na avaliação da presidente do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco, a discussão pode gerar controvérsias em relação à liberdade de expressão. “A minha preocupação é anterior à definição de quem deve participar desse grupo. É qual será a governança desse grupo. A gente precisa dar um passo atrás – existe uma intenção, ela pode ser interessante, desde que tenha governança muito clara, mas sem entrar na questão da liberdade de expressão”, frisou Patrícia.
Já o professor Anderson Nascimento, especialista em segurança da informação e privacidade da Universidade de Washington, defende a inclusão de Exército, Abin e Polícia Federal no debate. Segundo Anderson, boatos podem gerar distúrbios sociais, sendo, portanto, problema de política, de órgãos de polícia e de inteligência.
“É questão nacional. Tem de ter órgãos de inteligência participando porque é algo que pode afetar a segurança nacional. O caso dos Estados Unidos (com as evidências de que houve interferência da Rússia contra a campanha de Hillary Clinton) mostra que é possível haver uma potência estrangeira influenciando em campanha eleitoral”, opinou Nascimento.