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Solidão no Japão vira negócio e dá para alugar amigos e namorados

Foto: Franck Robichon/EFE

No Japão é possível alugar amigos para posar em fotos no Instagram, contratar um namorado para um encontro de mentira ou falsos parentes para participar de eventos sociais – e os serviços que contam com uma procura cada vez maior.

Esta particular ideia de negócio surgiu para Yuichi Ishii há uma década, quando decidiu acompanhar uma amiga, mãe solteira, e se fazer passar por seu marido durante uma entrevista em uma creche particular de Tóquio que não aceitava crianças de famílias monoparentais.

“Me dei conta de que existiam injustiças na sociedade japonesa, e vi que era possível oferecer serviços para cobrir esses vazios”, relata em entrevista o fundador da Family Romance, empresa pioneira em seu segmento no Japão.

Esse primeiro favor entre amigos foi seguido por outros, como reunir pessoas para se fingirem de “convidados supérfluo” em vários casamentos, e a partir de então Ishii decidiu profissionalizar seus serviços, ampliá-los e promovê-los através das redes sociais.

Sua empresa conta hoje com 1.200 funcionários, ou “atores”, como ele chama, e dispõe de um amplo menu que inclui o aluguel por hora de amigos, pais, mães, maridos, esposas, namorados, filhos ou colegas de trabalho.

Dezenas de companhias similares se proliferaram nos últimos anos, entre elas algumas dedicadas exclusivamente a pessoas solteiras ou de idade avançada, o que responde à queda do número de casamentos e ao acelerado envelhecimento demográfico no Japão.

No caso da Family Romance, seus “atores” contam com experiência e formação para desempenhar cada papel, enquanto o cliente pode basear sua escolha função das suas preferências sobre aspecto físico e personalidade, explica o fundador da empresa, um engenheiro de sistemas de 36 anos.

Também são oferecidos serviços específicos, como contratar um acompanhante para visitar a Disneylândia ou contemplar as “sakuras” (cerejeiras em flor) – planos frequentes para encontros românticos -, comparecer a um funeral, sair para correr ou ir ao karaokê; e inclusive para que o ator repreenda o cliente ou escute suas queixas sobre o trabalho.

Mas o produto principal atualmente é o aluguel de amigos para fazer “selfies” ao lado do cliente e postá-las no Instagram e outras redes sociais, segundo Ishii, que explica que o preço de um ator para estes casos é de 8 mil ienes (R$ 230) e que sua empresa recebe cerca de 50 pedidos mensais deste tipo.

“As pessoas querem construir hoje em dia sua própria imagem através das redes sociais. Nós as ajudamos oferecendo acompanhantes atraentes, com estilo e que sabem posar”, afirmou Ishii.

Outros clientes buscam suprir necessidades muito diferentes, como quem contrata um namorado ou uma namorada para vê-los uma vez por semana por 15 mil ienes (R$ 440), ou os que alugam pais e mães para seus filhos em várias ocasiões ao mês, por 20 mil ienes (R$ 580) a sessão.

O próprio fundador da empresa está há vários anos se fazendo passar pelo pai de uma filha de mãe solteira, e disse que “dói muito de cada vez que tem que se separar dela”, pois viu a pequena crescer e ela o considera como seu verdadeiro pai.

“Nesses casos não sei se estou atuando ou se são meus verdadeiros sentimentos”, confessa Ishii, que afirmou estar “tão cheio de experiências” – cada um dos atores da sua empresa pode desempenhar papéis em até cinco famílias diferentes – que é difícil se imaginar formando sua própria família.

O sucesso deste tipo de empresa pode ser explicado, em parte, pelas particularidades da sociedade japonesa, onde é fundamental manter as aparências e que cada pessoa cumpra seus deveres e obrigações correspondentes à sua posição.

“Antes havia famílias mais numerosas e as mulheres não trabalhavam. Hoje os pais e mães estão sempre ocupados, e há cada vez mais casos de divórcios, mães solteiras…”, contou Ishii, após refletir bastante ao ser perguntado sobre as motivações dos seus clientes para alugar um marido ou uma mulher.

O empresário também menciona a cultura de “omotenashi” (um conceito traduzível como “hospitalidade”), que obriga os japoneses a oferecer sempre sua melhor versão a outras pessoas, o que faz com que “deixem de cuidar de si mesmos, evitem pedir favores e evitem o contato com outros para não incomodar”.

Neste contexto, “para muita gente é mais fácil e agradável contratar um amigo ou um namorado que satisfaça suas necessidades emocionais, e com quem podem ser eles mesmos”, apontou Ishii, cuja empresa tem como lema oferecer “relações melhores que as reais”.

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