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Solidez da urna comprova que fraudes são alguns candidatos

Em países sérios, os homens da lei normalmente dão o exemplo. Obviamente que isso não é regra, mas é a norma. Não é o caso do deputado estadual Fernando Francischini (PSL-PR). Delegado da Polícia Federal, ele passou para a história da política brasileira como o primeiro parlamentar a ter o mandato cassado por difundir mentiras sobre o sistema eletrônico de votação. É muito para um país acostumado a empurrar para baixo do tapete o lixo produzido por autoridades que se acham acima do bem do mal? Pode ser. Entretanto, é muito pouco para mudarmos o Brasil, mas já suficiente para mostrar que os tempos são outros. O uso das redes sociais para difundir notícias falsas não é novidade. Todavia, embora o fato tenha se tornado corriqueiro, a decisão é inédita.

A banalidade das mentiras veio à tona principalmente depois da constatação de que o presidente da República não dispunha mais de votos capazes de sustentá-lo em uma brincadeira de reeleição. O absurdo protagonizado por Francischini não foi uma mentirinha engraçada. Pelo contrário. Foi um atentado à democracia, um deslize contra a robustez e inviolabilidade da urna, consequentemente contra a isenção e lisura da Justiça Eleitoral brasileira. Por isso, a necessidade de se cortar o mal pela raiz. Tratando-se de um parlamentar de 428 mil votos, não é uma simples transgressão espalhar, no dia da eleição, que duas urnas estavam fraudadas e aparentemente não aceitava votos no então candidato Jair Bolsonaro. “Profissional” da lei, o maldoso deputado não parou por aí.

Na criminosa live, ele também afirmou que as tais urnas tinham sido apreendidas e que ele conseguira documentos comprovando a fraude. Muito mais do que uma fake news delituosa, a palhaçada golpista acabou gerando filhotes mais portentosos, entre eles uma fracassada PEC apresentada pela turma que defende com unhas e dentes o aprofundamento do buraco negro cavado pelo governo do capitão. Para sorte do país e dos eleitores, pelo menos seis dos sete ministros do Tribunal Superior Eleitoral decidiram cassar o mandato e tornar o sujeito inelegível por oito anos. O ministro Carlos Horbach votou para absolver Francischini.

Lúcido e preocupado com a solidez do sistema, o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, definiu bem a clara intenção do deputado bolsonarista: “minar a credibilidade do processo eleitoral e das autoridades que o conduzem”. Vale lembrar que os boatos até tiveram tempo de ser reparados. Não foram pela má fé. A verdade dos vídeos divulgados com supostas dificuldades para votar em Bolsonaro era bem diferente da apresentada pelo deputado. As evidências de erro cometido pelo eleitor e a imediata intervenção da Justiça Eleitoral não foram mostradas pelo parlamentar. Portanto, quem com ferro fere com ferro deve ser ferido. Como disse Barroso, “as palavras têm sentido e poder. As pessoas têm liberdade de expressão, mas elas precisam ter responsabilidade pelo que falam”. Fernando Francischini não teve.

Desonrou quase 450 mil votos, perdeu o mandato e terá de reassumir as funções de homem da lei (?). Simples assim. E tem de ser sempre assim. O precedente está aberto. Desde sua criação, em 1996, a urna eletrônica é vista e avaliada pelo Brasil e pelo mundo como um produto inquestionavelmente seguro, isto é, fora de qualquer contexto da fraude eleitoral. A cada dois anos, milhares de milhões de brasileiros escolhem vereadores, prefeitos, deputados, senadores, governadores e presidente da República com absoluta certeza de que o voto dado será o voto contabilizado. Sou testemunha de que, ao longo desses 25 anos, não houve uma única dúvida que deixou de ser checada e dissipada em segundos. Em outras palavras, após a implantação da maquininha jamais um candidato foi eleito de maneira fraudulenta.

Se houve fraude (e foram muitas), a culpa é nossa, do eleitor. Refiro-me à fraude dos candidatos. Hoje, infelizmente, qualquer perna de pau nos representa. Até mesmo os despreparados chegam com facilidade às prefeituras, governos estaduais e Presidência da República. O episódio Fernando Francischini deve ajudar o povo a despertar dessa sonolência eleitoral. Ainda não aprendemos que votar é um ato silencioso e secreto, mas definitivo para que entendamos que, ao optar por um representante ou governante, temos de pensar nas prioridades da cidade, do estado e do país. Nunca somente em nós, em nossas casas ou em nossas ruas. Ainda sobre a segurança da urna, nunca é demais registrar recente auditoria da área técnica do Tribunal de Contas da União, cujo resultado acabou de vez com a tese da turma do cercadinho.

Conforme os auditores do TCU, o sistema eletrônico de votação do Brasil é seguro e auditável. Melhor foi a constatação de que a adoção do voto impresso levaria a um processo mais oneroso, mais moroso e com maior risco de fraudes. Quanto as fake news, seus produtores e divulgadores podem ter certeza de que serão punidos. Falsos e bizarros profetas do mundo moderno da política têm de estar atentos e preparados para a modernidade da Justiça Eleitoral. Mesmo baseada em algumas leis anacrônicas, a magistratura e os magistrados evoluíram. Quanto a nós, eleitores, melhor olhar para frente e eleger quem verdadeiramente consegue enxergar algum futuro no Brasil. É difícil, mas não impossível. Chega de saudade. A ordem deve ser o novo. Afinal, saudade é uma palavra que só existe na língua portuguesa.

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