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Sonho sonhado de Juliano, de caráter ímpar, não acabou

Mineiro de boa cepa e de ótima família, o advogado Juliano Costa Couto partiu muito antes do tempo. Foi sem cumprir um desejo que, imagino, era de todos os pares: concorrer um dia à presidência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados. Cacife, conhecimento, reconhecimento, coragem e liderança ele tinha de sobra. Faltava a oportunidade. Ela não virá, mas o sonho irrealizado deverá ser sonhado no plano superior. Lá, certamente ele ouvirá do mestre José Paulo Sepúlveda Pertence que o sonho sonhado não foi realizado por decreto do Pai Celestial.

Entretanto, ficam seu legado, sua obra, seu sorriso largo, sua família e, sobretudo, seu caráter, o mesmo do pai, Ronaldo Costa Couto, meu chefe quando de minha passagem, em 1988, pela direção da Empresa Brasileira de Notícias (EBN). Falar de Juliano é lembrar do velho e bom Ronaldo. Ministro-chefe da Casa Civil na administração de José Sarney, “enfrentamos” um problema que, em lugar de dividir, uniu ainda mais o governo do homem do bigode, apesar da tácita demissão de um ministro de Estado, o então chefe do Estado Maior das Forças Armadas, Brigadeiro Camarinha.

Como superintendente interino da empresa oficial de comunicação, em uma manhã de junho de 88, eu conduzia uma entrevista radiofônica com o brigadeiro Camarinha, que soltou o verbo contra a política salarial do governo Sarney. Em companhia do presidente da EBN, jornalista cujo nome não estou autorizado a declinar, e da então editora de Política, a falecida jornalista Olga Bardawil, a entrevista “bombou” internamente, o que animou o colega presidente a determinar a edição e veiculação na rede nacional da empresa. A imediata repercussão foi como rastilho de pólvora. Sintetizando a “obra”, a EBN foi extinta, o ministro exonerado e os três condutores da entrevista demitidos sumariamente.

Na tarde do mesmo dia, após o estrago irrecuperável, o ministro Ronaldo Costa Couto me chamou ao Palácio. Sem saber por onde começar, preferi ouvir. “Vocês soltaram uma bomba de várias ogivas. As consequências não poderiam ser outras”. Pedindo humildemente a palavra, expliquei ao ministro que, como cumpridor de ordens, coloquei a degravação da entrevista do brigadeiro na rede a pedido do presidente da EBN. Disse também que Olga Bardawil não merecia ser demitida, pois, assim como eu, cumpriu ordens minhas para editar e publicar o material.

Até hoje não tenho certeza, mas imagino que a honestidade foi a condutora da revogação da demissão. Reconduzido, virei o chefe do espólio até que a EBN fosse “abiscoitada” pela Radiobrás, presidida à época pelo queridíssimo amigo jornalista Antônio Martins, também falecido. Por conta da EBN e da Radiobrás, passei 18 anos de minha vida profissional cedido ao Judiciário, onde atuei como porta-voz do Supremo Tribunal Federal (STF), do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Meu caro Juliano Costa Couto, não era próximo de vossa excelência, mas tive a honra de servir ao vosso pai. Por isso, usando de seu prematuro passamento, me senti na obrigação de lembrar do ministro Ronaldo Costa Couto somente para ratificar que tal pai, tal filho. Você dignificou a história ímpar, irreparável e inquestionável do “velho”. Se puder, diga ao Sepúlveda Pertence, de quem fui assessor, que, do mesmo modo que admirei e admiro o mestre Ronaldo, jamais deixarei de ser fã de seus vastos conhecimentos jurídicos. Dos seus também, Juliano Costa Couto. Descanse em paz.

*Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras

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