Sinônimo de obstinação ou zelo religioso que pode levar a extremos de intolerância, o fanatismo também pode ser entendido como faccionismo partidário ou a adesão cega a um sistema ou doutrina. São sentimentos ruins, que corroem a alma, o coração e a mente. Entretanto, nada pior do que a adoração virar dedicação excessiva a alguém ou algo. É a tal da paixão. O melhor combate à beatice exagerada é o conhecimento. Portanto, antes de idolatrar, procure conhecer a história do ídolo. Não precisa ir muito longe. Basta saber o que e como fez o que diz que fez. Se é que fez. No caso do atual ocupante do Palácio do Planalto, a idolatria é um embuste, da mesma forma que o idolatrado não passa de um engodo forjado nas redes sociais alimentadas por um familiar tão nocivo.
Querem mesmo ter informações a respeito do mito? É fácil. Pesquisem as próprias redes sociais. Está lá uma fieira de negacionismos, de propostas, ações, reações nada republicanas. De positivo apenas o tempo que falta para o fim do governo. É pouco? Já foi pior, principalmente quando os fanáticos tinham certeza de que o “homi” havia descido à terra para salvar o Brasil e livrar os brasileiros do comunismo e da corrupção. Meu Deus!!!! Santa ingenuidade. Que comunismo? Quanto à corrupção, qual a diferença de ontem para hoje? Se é que existe, está limitada ao Centrão no controle absoluto das máquinas administrativa e financeira. Que o digam as emendas parlamentares anônimas, o cabuloso montão de dinheiro para campanhas eleitorais e outro inescrupuloso punhado de recursos para aumento dos agentes penitenciários e das polícias federal, civil e fardada.
É o Brasil de castas, de grupelhos, de brasileiros diferenciados. Enquanto isso, os cidadãos comuns, os que efetivamente votam, recolhem impostos e pagam em dia IPVA e IPTU, morrem de fome. Tudo isso com empenho direto do mito e do seu principal cortejador, o ministro Paulo Guedes (Economia), e graças ao rico e suado orçamento da falida Previdência Social, bem como dos precatórios determinados pela Justiça para pagamento (?) ao pobre do trabalhador, notadamente os aposentados, cuja importância para deputados, senadores, presidente da República, ministros do Supremo Tribunal Federal e policiais é nenhuma. Absolutamente nenhuma, embora suas excelências, inclusive as de toga, tentem mostrar o contrário. Para os que se acham com linhagem, os demais são ralé, pessoas de terceira categoria, eleitores sem eira nem beira.
É o povo que vive caindo pela série de rasteiras dos apaniguados ou encastelados do governo. Na análise mais lúcida desses quase três anos, podemos afirmar que é um resumo cruel do período bozolítico, especialmente de 2021, quando foram contabilizadas cerca de 620 mil mortes por conta daquela “gripezinha” sem importância. Também registramos uma inflação acumulada de 47,5% entre o fim de 2014 e setembro deste ano, a quarta maior taxa de desemprego do mundo e experimentamos a volta do assombro da fome, que já atingiu 27,4 milhões de brasileiros. É esse o país do rei sem trono, com um palácio temporário, mas com súditos instáveis, ocasionais, descontinuados e subservientes. São vassalos interinos pra lá de sonhadores com um mundo só deles. É a piada de país onde qualquer pode se achar rei. O resto que se exploda. Se possível, que morra. Preferencialmente de uma vez só.
Como Deus não dorme e é justo, a explosão ocorrerá – já está ocorrendo -, mas de forma inversa. Aportuguesando a frase latina potiusque sero quam numquam, do livro escrito por Titus Livius no século IV, antes tarde do que nunca. A turma do sei lá entende se arvora a conhecer de tudo, mas a verdade é que nada sabe. Pior, muito pior é quando acham que mandam em todos desgovernadamente. Pode ser, mas um dia a casa cai. E o castelo de areia do Jair faz tempo começou a entrar água. Na realidade, está descendo morro abaixo. A arrogância, o destempero o desmazelo e até a baixaria não só dividiram o Brasil entre o país que Bolsonaro ama e o que ele detesta, mas o transformaram em terra inóspita.
A última foi repetir uma faceta conhecida desde os tempos de parlamentar de picadeiro, aquele que tem poucas cenas e, quando consegue alguns segundos para aparecer, faz duas ou três caretas, xinga meia dúzia e novamente desparece sob a lona. No fim de semana, durante passeio de lancha no Guarujá, em São Paulo, ele, ao lado de bajuladores sem nexo, cantou e dançou o funk alcunhado de “Proibidão do Bolsonaro”. De autoria do famoso desconhecido Tales Volpi (MC Reaça), a “música” compara as feministas de esquerda a cadelas. Ao entoar publicamente a porcaria de letra, o presidente da República chama as mulheres de cadelas. Não é nenhuma novidade para o capitão que, sabe-se lá como, chegou à Presidência, mas, graças a Deus, a Presidência jamais chegou ao capitão. Aliás, ao tenente com soldo de capitão.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978